Igreja dá resposta ambígua à fala de cardeal sobre gays
Folha de S. Paulo - 15/04/2010
Vaticano desqualifica declaração de número dois do Vaticano relacionando pedofilia e homossexualidade, mas não a nega Porta-voz do papa Bento 16 afirma que 60% dos abusos contra crianças no ambiente eclesiástico são cometidos por padres homossexuais DA REDAÇÃO
O Vaticano respondeu ontem de forma dúbia à revolta mundial deflagrada na segunda-feira pelo cardeal Tarcisio Bertone, que relacionou a pedofilia à homossexualidade. A Santa Sé disse que o eclesiástico não deveria ter feito a controversa declaração mas insistiu em que padres gays são responsáveis pela maioria dos abusos cometidos contra menores na igreja.
Após protestos de associações gays e governos de vários países, o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, divulgou ontem um comunicado em que cita um estudo que "resulta simplesmente no dado estatístico" de que 60% dos 3.000 casos registrados pela Congregação da Fé desde 2001 envolvem "pessoas do mesmo sexo".O Vaticano, que tenta há semanas se defender das acusações de acobertar casos de pedofilia, preferiu desqualificar o cardeal Bertone como autor das declarações em vez de desmenti-las. "As autoridades eclesiásticas não se consideram competentes para fazer afirmações gerais de caráter psicológico ou médico, as quais cabem naturalmente ao estudo de especialistas e às pesquisas em curso", diz a nota do porta-voz.
Lombardi também buscou minimizar o alcance das controversas declarações de Bertone e disse que "o cardeal evidentemente se referia à problemática dos abusos sexuais da parte dos sacerdotes, e não da população em geral".
Na prática, a Santa Sé esquivou-se de eliminar por completo o elo entre homossexualidade e pedofilia. O Vaticano também não emitiu uma condenação mais vigorosa contra Bertone, que ocupa o segundo cargo mais importante na hierarquia da Igreja Católica.
As controversas declarações de Bertone foram dadas em conversa com jornalistas durante visita ao Chile. O cardeal afirmou que a pedofilia entre os sacerdotes é fruto da identidade sexual de alguns padres. "Muitos psicólogos e psiquiatras demonstraram que não há relação entre celibato e pedofilia, mas muitos outros demonstraram que há entre homossexualidade e pedofilia", disse. "Essa patologia [pedofilia] aparece em todos os tipos de pessoas e, nos padres, em um grau menor em termos percentuais", disse o religioso italiano.
Desde que um relatório da Igreja Católica na Irlanda, publicado em 2009, revelou que 15 mil crianças foram abusadas por religiosos entre os anos 30 e 90, denúncias vêm se multiplicando na Europa e nos EUA.
Uma linha telefônica para denúncias anônimas por vítimas aberta no fim do mês passado na Alemanha -país natal do papa Bento 16- recebeu quase 15 mil ligações em uma semana. Uma das principais acusações é a omissão dos superiores na hierarquia católica.
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