Autor(es): JOÃO BATISTA NATALI - COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Folha de S. Paulo - 19/04/2010
Padre por apenas 15 meses e avesso a viagens, papa já desagradou judeus e muçulmanos
Bento 16 completa hoje cinco anos de pontificado com a igreja altamente encrencada pelas acusações de acobertamento, por seus dirigentes, dos escândalos de pedofilia. No fundo, era só o que faltava. Pequenos incidentes já haviam indisposto Joseph Ratzinger com muçulmanos e judeus.
Caso não reaja com a energia e a rapidez proporcionais aos ataques recebidos, o papa estará dando indiretamente razão ao semanário alemão "Der Spiegel", que qualificou de "malogro" o atual pontificado e descreveu "a tragédia de um homem forjado para escrever livros [foram mais de 40] e que apenas no final de sua vida foi eleito para assumir a hercúlea tarefa de chefiar o Vaticano".
É até possível que Bento 16 se lembre, agora angustiado, de sua primeira reação ao encabeçar, no conclave de 2005, a primeira votação dos cardeais que elegeriam o sucessor de João Paulo 2º. Dias depois ele diria a peregrinos alemães ter rezado para que Deus não o colocasse no trono de São Pedro. "Escolha alguém mais forte", teria pedido ele na oração.
O problema é que o Vaticano não é uma estrutura burocrática com a agilidade ou o modelo empresariais. Suas reações são lentas, sua linguagem é excessivamente metafórica. Não há receitas de uma contraofensiva violenta. A igreja está hoje numa morosa defensiva, enquanto vítimas de padres pedófilos tiram proveito, e com razão, da velocidade da internet.
"Temos problemas de comunicação, poderíamos fazer melhor", disse há dias Giovanni Maria Vian, editor do "L"Osservatore Romano", jornal oficial da Igreja Católica.Alguns vaticanistas acreditam que Bento 16 iniciou seu pontificado com as mãos vazias. A grande tarefa da igreja, que ele cumpriu sob João Paulo 2º, como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé (ex-Inquisição), foi a de neutralizar a teologia da libertação e conter o clero progressista.
Sem os sobressaltos que se seguiram, o papa poderia se limitar a apenas gerir as questões correntes da igreja.
Ratzinger é um homem de gabinete. Foi padre de paróquia por apenas 15 meses. Não gosta de se ver cercado de gente. Viaja relativamente pouco -apenas 14 viagens ao exterior e 17 visitas pastorais dentro da Itália. Escreveu três encíclicas.
Nenhuma delas teve o impacto da conferência que fez em setembro de 2006 na universidade alemã de Regensburgo, quando citou um imperador bizantino que caracterizava o profeta Maomé como alguém que impôs o islã "pela espada".
A reação verbal do mundo muçulmano foi esperadamente violenta, e o papa acrescentou mais um problema à viagem que faria em novembro daquele ano à Turquia.
Sem dar ao diálogo ecumênico o mesmo peso que seus predecessores, Bento 16 também desagradou aos judeus ao restaurar na liturgia uma oração da Sexta-Feira Santa que pede a conversão deles ao cristianismo. A comunidade judaica tampouco perdoa o papa pela punição insuficiente de um cardeal que negou o Holocausto ou por se empenhar na canonização de Pio 12, acusado de ambiguidades diante dos extermínios em massa durante a Segunda Guerra Mundial.
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