domingo, 4 de abril de 2010

Punidos pela ditadura voltam à universidade

Autor(es): ANGELA PINHO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Folha de S. Paulo - 04/04/2010

Com base em uma lei de 2002, Comissão da Anistia reabre vagas em cursos para alunos expulsos durante o regime militar Ao voltar à USP em 2007, Jorge Gonzaga encontrou entre seus professores três colegas de sua passagem pela universidade em 1969

Sérgio Lima/Folha Imagem
Iraê Sassi, aluno vítima de perseguição política durante o regime militar, mostra o Fusca que comprou ao regressar ao país em 2000

Assim que as aulas na UnB (Universidade de Brasília) recomeçarem, um veterano se destacará entre os rostos de adolescentes que chegarão direto do ensino médio.
Trinta e oito anos após deixar a capital do país para não ser preso pela ditadura militar (1964-1985), Iraê Sassi, 59, voltará à universidade por uma decisão da Comissão da Anistia do Ministério da Justiça -amparada em uma lei de 2002.
Não há número oficial sobre quantas vagas em instituições de ensino o órgão já reabriu para anistiados. A Folha localizou seis casos e conversou com três protagonistas. "Do ponto de vista econômico, eu nem precisaria voltar", diz Sassi. "Mas, do ponto de vista moral, fiz questão", diz ele, que cursará letras (tradução), área em que já atua.
Sua ligação com a UnB vem desde a infância. Seu pai era assessor do fundador da instituição, Darcy Ribeiro, e ele costumava passar as tardes no campus. A lembrança, porém, não é tão boa em relação à sua primeira passagem como aluno.
Após participar do movimento secundarista, em 1969 ele passou no vestibular para engenharia mecânica. Sua ficha no SNI (Serviço Nacional de Informações), no entanto, levou os dirigentes da UnB a recusarem sua matrícula.
Questionado na Justiça, o então reitor Caio Benjamin Dias disse, em 1970, que a medida era necessária porque não se poderia admitir que a universidade recebesse "estudantes hostis à ordem".
A argumentação não foi aceita em segunda instância, e Sassi chegou a cursar alguns meses de engenharia. Frequentava a casa do líder estudantil Honestino Guimarães. Depois de ser presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), Honestino desapareceu em 1973.

Porto Alegre
Três anos antes, a então estudante de jornalismo Maria Regina Jacob Pilla avisara aos pais que faria uma viagem e voltaria a Porto Alegre dali a um mês.
Integrante de uma organização clandestina cujo nome prefere não ver publicado, acabou ficando presa por dois anos na Argentina e se exilou na França até 1979, ano da Lei da Anistia.
Ao obter o direito de voltar à UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), em 2007, resolveu mudar para letras. Já na sua primeira passagem pela universidade havia se desiludido com o curso de jornalismo -"muito chato". Já a segunda passagem pela universidade foi uma decisão mais consciente e mais prazerosa.
A integração com os colegas é uma questão em aberto: com alguns é mais fácil, com outros, não: "Posso ser muito dura com as pessoas. Quem passa por tortura fica com uma violência muito grande introjetada".

São Paulo
Ao voltar para a Escola de Comunicações e Artes da USP, em 2007, Jorge Gonzaga, 65, sentou-se ao lado de alunos que em sua maioria tinham 17 e 18 anos. Entre seus professores, encontrou três colegas da sua primeira passagem pela universidade, em 1969. Naquela época, Gonzaga foi para o Nordeste alguns meses após começar o curso de comunicação.
Tendo ficado 11 meses preso por ter distribuído um panfleto "subversivo", pensou que seria novamente preso caso ficasse em São Paulo. Após a vitória na Comissão da Anistia, fez dois anos de jornalismo, mas achou o curso "inacreditavelmente ruim" e voltou ao Rio, onde trabalha com teatro de bonecos.
Na sua volta à universidade, achou que os alunos dos diferentes cursos se integravam cada vez menos, mas se surpreendeu com a recepção dos jovens colegas: "Fui preparado para ficar isolado, mas eles tinham muita curiosidade sobre mim. Ainda mantemos contato".

"ANTES TARDE DO QUE NUNCA" Acredito que o período entre 1964 e 1985 não deve ser esquecido. Deixo o link para um texto meu feito por ocasião do último 31 de março: http://www.medioparaiba.com.br/revista/noticia.php?l=0f620436ae5905caccbde3a5dbb7deb3

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