Nova redação do programa não defende o aborto, libera uso de símbolos religiosos e atende a reivindicações de militares, agronegócio e mídia
Publicado em 14/05/2010 | Das agências Fale conosco RSS Imprimir Enviar por email Receba notícias pelo celular Receba boletins Aumentar letra Diminuir letra Brasília - A terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3), lançada em dezembro pelo presidente Lula, foi modificada ontem com a publicação, no Diário Oficial da União, do Decreto Presidencial n.º 7.177, que altera parte da redação do plano. Foram atenuados os pontos mais polêmicos – como a defesa da descriminalização do aborto, a proibição da ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União, a criação de uma instância não judicial para mediar as desocupações de terras, a instituição de mecanismos para controlar os meios de comunicação e os trechos considerados pelas Forças Armadas como “revanchistas” contra agentes da ditadura militar (1964-1985).
Sobre a interrupção da gravidez, o texto original do documento defendia o apoio governamental à “aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto’’. Agora, a nova redação eliminou a possibilidade de descriminalização do aborto – atendendo a apelos da Igreja Católica. Já o trecho que pretendia restringir o uso de símbolos religiosos foi totalmente cortado na nova versão.
Ainda com essas modificações, a Igreja reafirmou ontem sua condenação do PNDH. O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Dimas Lara Barbosa, disse ontem, no encerramento da 48.ª Assembleia-Geral da entidade, em Brasília, que o fato de o governo ter alterado alguns itens questionáveis do plano não muda a posição da Igreja a respeito do assunto.
“Nossa declaração [crítica] sobre o tema vale para a versão original e para a modificada”, disse dom Dimas. O PNDH tem outros itens condenados pela Igreja, que não foram modificados: a defesa do casamento entre pessoas do mesmo sexo, a adoção de crianças por casais homoafetivos e a profissionalização da prostituição.
Audiência obrigatória
O decreto presidencial também modificou a proposta de instituir audiências públicas obrigatórias antes da reintegração de posse de áreas rurais e urbanas ocupadas – mesmo aquelas com determinação judicial.
A proposta era criticada pelo Ministério da Agricultura e pela Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Com a nova redação, a ideia de propor um projeto de lei sobre a mediação prévia entre proprietários e ocupantes de propriedades foi mantida, mas “sem prejuízo de outros meios institucionais [como a reintegração de posse judicial]’’.
Os meios de comunicação também foram atendidos. O novo texto não tem o trecho que propõe a criação de lei prevendo “penalidades administrativas, suspensão da programação e cassação de concessão para os veículos que desrespeitarem os direitos humanos’’ – o que era interpretado como uma tentativa de cercear a liberdade de imprensa.
Os militares também tiveram suas queixas atendidas na nova redação, que agora não faz referências diretas a possíveis responsabilizações de agentes da ditadura militar por violações de direitos humanos.
Texto modificado
Confira o que mudou na nova redação do Plano Nacional de Direitos Humanos:
Símbolos religiosos
Como era: previa proibir a ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União.
Como ficou: a proposta foi cortada.
Aborto
Como era: apoiava a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto.
Como ficou: não apoia o aborto, mas considera-o como um tema de saúde pública.
Mídia
Como era: previa a criação de critérios de acompanhamento editorial e de um ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios de direitos humanos. Previa penalidades a rádios e tevês que não respeitem os direitos humanos.
Como ficou: estabelece apenas o respeito aos direitos humanos, mas não prevê penalidades.
Conflitos no campo
Como era: previa a instituição de audiências públicas para discutir reintegrações de posse já determinadas pela Justiça.
Como ficou: valoriza a mediação dos conflitos, mas reconhece o papel da Justiça.
Ditadura militar
Como era: previa a identificação e sinalização de locais públicos que serviram à repressão ditatorial; a proibição de logradouros públicos serem batizados com nomes de agentes do regime; e instituição de ações educativas para conscientizar a população sobre a ditadura militar. Também estabelecia o acompanhamento de processos judiciais de responsabilização civil ou criminal sobre casos de violação de direitos humanos praticados por agentes do regime.
Como ficou: manteve a identificação de locais e as ações educativas, mas com um texto diferente, “aprovado” pelos militares. Não propõe a proibição de espaços públicos recebrem o nome de agentes da ditadura. Fala em responsabilização civil (e não criminal) de quem praticou graves violações de direitos humanos entre 1964 e 1985 – incluindo, além de militares, os opositores do regime.
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