sábado, 29 de outubro de 2011

Metalúrgicos podem entrar em greve

O Globo - 29/10/2011

Trabalhadores querem 5% de aumento real

SÃO PAULO. Os metalúrgicos de São Paulo ameaçam entrar em greve a partir da semana que vem se os empresários não apresentarem uma nova proposta de reajuste salarial. Eles vão se reunir amanhã em uma assembleia na sede do sindicato para decidir sobre a paralisação. Na última quinta-feira, os trabalhadores rejeitaram proposta de reajuste entre 7,5% e 8,4%. Miguel Torres, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes, disse que um pedido de aumento real de 5% nos salários está de acordo com o desempenho da economia este ano.

As reivindicações são aumento real, elevação do piso, redução da jornada, participação nos lucros para todos, estabilidade aos acidentados e portadores de doenças profissionais, licença-maternidade de 180 dias e inclusão digital, entre outras. A categoria tem data-base em 1º de novembro. A campanha salarial é unificada e envolve cerca de 800 mil trabalhadores.

Em São José dos Campos, no interior de São Paulo, os funcionários da Embraer também rejeitaram uma proposta de reposição da inflação mais aumento real de 1% a partir de 1º de novembro. Um aviso de greve já foi protocolado. Os trabalhadores reivindicam reajuste de 17,45% e redução da jornada de trabalho.


Prédio da USP ocupado

Autor(es): » Ullisses Campbell
Correio Braziliense - 29/10/2011

Cerca de 200 estudantes avisam que só deixam a faculdade quando policiais militares saírem da universidade

São Paulo — Depois de entrar em confronto com a Polícia Militar (PM), que tentava deter três alunos que fumavam maconha no estacionamento do câmpus, estudantes da Universidade de São Paulo (USP) pediram, ontem, formalmente à reitoria a saída de militares do maior centro acadêmico do país. Essa seria a condição para que cerca de 200 alunos desocupem o prédio administrativo da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Em nota, o reitor João Grandino Rodas diz não ter competência para ordenar a retirada dos guardas armados da cidade universitária, na Zona Oeste de São Paulo. O departamento jurídico da universidade entrou na Justiça com pedido de reintegração de posse.

Depois de 30 anos proibida de atuar no local devido a rixas durante a ditadura, a Polícia Militar voltou à USP em maio deste ano após o assassinato de um aluno. E coleciona, principalmente com estudantes das humanas, situações de conflito. Nas blitzes montadas nas principais entradas do câmpus, é comum alunos se recusarem a mostrar documentos ou mesmo a abrir o porta-malas do carro para fiscalização. "Não mostro mesmo documentos para esses policiais. Eles não têm moral alguma para nos revistar", diz Patrícia Advenssude, 23 anos, estudante de letras.

A gota d"água foi a abordagem feita por três policiais na noite da última quinta-feira a três estudantes que fumavam maconha no estacionamento da Faculdade de Economia e Administração. Segundo os PMs, eles pediram que os dois estudantes os acompanhassem até a delegacia. Não houve resistência, mas um grupo de alunos se aproximou, dizendo que os policiais não tinham "autoridade moral" para fazer esse tipo de ação no câmpus.

O impasse entre PMs e estudantes ganhou adesão de funcionários e acabou em conflito. Pelo menos 200 universitários invadiram a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas na tentativa de impedir que os estudantes fossem detidos. Em nota, o Sindicato dos Trabalhadores da USP disse que a PM é violenta e não sabe lidar com estudantes de universidades públicas. Já a polícia afirma que conteve a manifestação sem violência e assegura que só houve confronto porque os estudantes atacaram um carro da corporação em que estava um delegado. De acordo com a PM, três policiais ficaram feridos e cinco carros da corporação foram danificados.


Lixo hospitalar: empresa tem R$ 126 mil bloqueados

Correio Braziliense - 29/10/2011

A Justiça do Trabalho de Pernambuco determinou o bloqueio de R$ 126 mil da empresa Império do Forro de Bolso, que revendia peças feitas com lençóis usados dos Estados Unidos.
A medida foi em resposta ao pedido do Ministério Público do Trabalho, que havia pedido o bloqueio de R$ 2,1 milhões para o custeio de possíveis rescisões contratuais e de indenizações.
A decisão tem caráter preventivo. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também está de olho no caso. Ontem, se reuniu com as vigilâncias sanitárias locais para padronizar os procedimentos adotados em caso de lixo hospitalar. O entendimento é que o material passe por um processo de lavagem e de desinfecção ou seja descartado. Os lençóis apreendidos (foto) continuam no Porto de Suape (PF).
Há a possibilidade de ele serem reenviados aos EUA.




Outros 320 alunos tiveram acesso a questões do Enem

Cursinho do Ceará também distribuiu questões do Enem para 320 alunos
Autor(es): PAULO SALDAÑA , ENVIADO ESPECIAL / FORTALEZA
O Estado de S. Paulo - 29/10/2011

Cerca de 320 alunos do curso pré-universitário do Colégio Christus, de Fortaleza (CE), também tiveram acesso com antecedência às questões idênticas às que caíram no Exame Nacional do Ensino Médio deste ano. Os mesmos cadernos entregues aos alunos do 3º ano do ensino médio foram oferecidos, pelo mesmo professor, aos que realizam cursinhos. Até agora, o Ministério da Educação determinou apenas o cancelamento da prova dos 369 concluintes do ensino médio. A Justiça deu prazo de 72 horas para o Inep, que organiza o Enem, se manifestar sobre o caso.

Educação. Cadernos entregues aos estudantes do 3º ano do ensino médio do Colégio Christus, de Fortaleza, também foram dados pelo mesmo professor aos estudantes do cursinho mantido pela instituição; segundo MEC, exame desses candidatos não será anulado

- O Estado de S.Paulo

Cerca de 320 alunos do curso pré-universitário do Colégio Christus, de Fortaleza, também tiveram acesso com antecedência a questões idênticas às que caíram no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano. Os mesmos cadernos entregues aos alunos do 3.º ano do ensino médio foram também oferecidos aos que realizam cursinhos - e pelo mesmo professor. Informado pelo Estado, o Ministério da Educação (MEC) disse que mantém a decisão de cancelar a prova apenas dos 639 concluintes do ensino médio.
 


Estudantes do cursinho confirmaram ter recebido o caderno com a mesma antecedência que os outros. "Eu recebi os cadernos e fiz as questões. Até minha irmã, que não estuda no Christus, mas também fez o Enem, viu as questões em casa e resolveu comigo", disse a aluna do cursinho no Christus Amanda Galdino Carneiro, de 20 anos. Segundo ela, foi o professor de física Jahilton Motta quem entregou o caderno com os itens. "Ele comentou para não nos impressionarmos se uma ou duas questões do material caíssem no Enem."

Também estudante do cursinho, Robert Pouchain, de 20 anos, teve acesso ao caderno. "Recebemos o material. Mas as questões do pré-teste já estarem neste Enem mostra uma fragilidade do Inep", disse.

Os dois são alunos da unidade Christus Sul, no Alagadiço Novo, onde o professor Jahilton deu aula ontem - o prédio fica distante da sede localizada na Aldeota, onde o assédio da imprensa é maior e, segundo funcionários, o professor não foi visto nesta semana.

Os alunos contaram que o professor começou a aula comentando o episódio. Ele, que dá aulas há mais de 30 anos no colégio, teria dito que seu nome tem sido "exposto" na imprensa e se defendeu dizendo que não teria feito nada de errado.

Pelo relato dos alunos, Jahilton não deu detalhes de como as questões do pré-teste (realizado na escola há um ano) foram parar nas mãos dele e, depois, entregues aos alunos da escola. "Como ele é coordenador dos professores, é sempre quem entrega esse tipo de material extra", diz Amanda. Os dois alunos defendem o cancelamento total da prova - ou pelo menos das questões iguais.

Sedes. O Colégio Christus tem oito turmas de cursinho pré-vestibular, com estudantes que já terminaram o ensino médio. As aulas ocorrem em quatro das dez unidades do Christus na capital cearense. Segundo alunos e funcionários da escola ouvidos pelo Estado, a maioria dos professores se reveza nas aulas para as duas modalidades.

Em algumas unidades, como a da Aldeota, o prédio tem salas de cursinho e também de 3.º ano do ensino médio. Na unidade Sul, em Alagadiço Novo, onde o professor Jahilton deu aula ontem, há salas de educação infantil e apenas uma voltada ao pré-universitário.

Incoerência. Ao reclamar da decisão do MEC de cancelar a prova apenas dos 639 concluintes do ensino médio, estudantes do 3.º ano também reclamaram da decisão. "Foi muito incoerente. Porque tem aluno do 3.º ano que faltou no dia e não recebeu. E os do cursinho, que também receberam", disse a estudante Lia Albuquerque, de 17 anos.

O Ministério da Educação, por meio de sua assessoria de imprensa, confirmou que não vai alterar a decisão sobre o número de alunos que terão o Enem cancelado e deverão refazer as provas - já marcadas para os dias 28 e 29 de novembro.

Segundo a assessoria da pasta, não há provas de que mais estudantes tenham tido acesso ao material. / COLABOROU CARMEM POMPEU

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

EUROPA ACERTA CALOTE DA GRÉCIA E BOLSAS DISPARAM

CALOTE ORGANIZADO
Autor(es): agência o globo:
O Globo - 28/10/2011

Europa acerta com credores perda de 50% da dívida e mercados reagem com euforia: bolsas disparam até 6% e dólar despenca

Depois de mais de dez horas de discussões, às 4h da manhã de ontem em Bruxelas, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, anunciou que os 17 chefes de Estado e de governo da zona do euro chegaram a um acordo sobre a dívida grega, segundo o qual o setor privado arcará com perdas de 50% do valor dos papéis em suas mãos. Esse percentual é muito superior aos 21% acertados em julho e deve equivaler a 100 bilhões. O Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), que representa os credores privados, resistia a um calote dessa magnitude. Mas, segundo a revista alemã "Der Spiegel", as autoridades europeias avisaram que, se eles não aceitassem voluntariamente os 50%, este percentual lhes seria imposto. Os mercados festejaram, com bolsas subindo até 6% e as ações dos bancos disparando, mas analistas têm dúvidas de que esse novo pacote vá resolver a crise da dívida na zona do euro.

"Deram uma aspirina ao país. Mas ainda falta um tratamento de choque", disse ao jornal francês "Le Monde" o economista do banco Natixis, Sylvain Broyer. Para ele, sem uma espécie de Plano Marshall (que reconstruiu a Europa após a Segunda Guerra Mundial), a Grécia continuará a ser "uma máquina de dívida".

A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) seguiu a euforia dos mercados internacionais e avançou 3,72%, aos 59.270 pontos pelo Ibovespa, maior patamar em três meses. Mais confiantes, os investidores estrangeiros voltaram ao mercado brasileiro com pesadas compras de ações, o que alavancou o volume de negócios para R$10,1 bilhões. Os destaques ficaram para exportadoras de matérias-primas, como Vale e siderúrgicas, mas os ganhos foram generalizados. Na máxima do dia, o Ibovespa chegou a subir 4,83%, próximo dos 60 mil pontos.

Sarkozy: foi um erro incluir Grécia no euro

Com o maior apetite a aplicações de risco, o dólar comercial despencou 2,90%, a R$1,709, menor patamar desde 15 de setembro. No mês, a moeda americana acumula queda de 9,19%, frente a uma alta de 18,14% em setembro. Já o dólar turismo podia ser comprado nas casas de câmbio e bancos por R$1,83. Também houve influência da ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), que sinalizou a continuidade de redução da Taxa Selic.

Em Nova York, o índice Dow Jones fechou em alta de 2,86%, enquanto Nasdaq e S&P avançaram 3,32% e 3,43%, respectivamente. As altas mais fortes foram na Europa: Paris saltou 6,28%, e Frankfurt, 5,35%. Londres avançou 2,89%. As ações dos bancos europeus dispararam: enquanto Société Générale e Crédit Agricole saltaram mais de 20%, Barclays avançou 18%, BNP Paribas, 17%, e Deutsche Bank, 16%. O euro chegou a subir 2,5%, a US$1,4247, recuando depois a US$1,4189.

Em Tóquio, o Nikkei subiu 2,40%. Seul avançou 1,46%, Hong Kong, 3,26%, e Cingapura, 2,80%.

Álvaro Bandeira, diretor de Varejo da Ativa Corretora, acredita que, com os investidores estrangeiros mais confiantes, pode haver uma recuperação do mercado brasileiro nas próximas semanas:

- Nem tudo foi resolvido, apenas combinado. Existem diversas questões em aberto. Mas houve avanços importantes e isso foi o bastante, por enquanto, para os mercados.

Com essa redução de 50% na dívida em mãos do setor privado, os líderes europeus esperam reduzir o endividamento grego a 120% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) em 2020, frente aos atuais 160%.

Mas boa parte dos economistas ouvidos ontem pela agência Reuters - 24 de 47 - acham que esse percentual não é suficiente. A projeção média seria de perdas de 70%.

- O mundo estava olhando para nós hoje, e mostramos que chegamos às conclusões corretas - afirmou a chanceler alemã, Angela Merkel.

Já Sarkozy, ao fazer um pronunciamento na televisão francesa à noite, afirmou que a entrada da Grécia na zona do euro foi um erro.

- Nem Merkel nem eu estávamos em nossos cargos quando se decidiu incluir a Grécia na zona do euro (em 2001). Foi um erro.

Detalhes, somente em novembro

Além disso, foi acertada a ampliação do poder de fogo do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Feef), hoje em 440 bilhões, para cerca de 1 trilhão. Para chegar-se a esse valor, é preciso descontar o montante do Feef que está sendo usado para socorrer Irlanda, Portugal e Grécia, restando cerca de 250 bilhões.

Os detalhes sobre a ampliação do Feef serão acertados em novembro, durante reunião dos ministros de Finanças do bloco. Segundo o comunicado divulgado ontem, serão adotados dois caminhos: a concessão de garantias na emissão de títulos soberanos da zona do euro e a criação de um fundo de investimento para atrair recursos externos, como de fundos de pensão e soberanos.

O outro ponto acertado diz respeito à recapitalização dos bancos europeus. Esta afetará 91 instituições, que terão de elevar seu colchão de reserva de 4% para 9% do capital.





Haddad acusa professores do Ceará de copiar e distribuir questões do Enem


O Estado de S. Paulo - 28/10/2011

Ministro dá a 1ª entrevista após a anulação de exame de 639 alunos do Colégio Christus, que antecipou perguntas em "simulado"

O ministro da Educação, Fernando Haddad, disse nesta quinta-feira ter "fortes indícios" de que professores do Colégio Christus, de Fortaleza, copiaram e distribuíram a alunos dez dias antes do Enem questões que caíram na prova. Haddad afirmou que a decisão anunciada ontem de anular as provas de 639 alunos da escola visa a garantir a "isonomia" do Enem, mas rejeitou a hipótese de cancelar, para todos os candidatos, as questões antecipadas na íntegra.

O Ministério Público Federal no Ceará pediu hoje a anulação de questões do Enem – segundo o Ministério da Educação, 9 delas foram antecipadas na íntegra pelo Colégio Christus, de Fortaleza. O próprio colégio defendeu isso, alegando que o responsável pelo sigilo da prova é o governo e os alunos foram punidos. Há hipótese de anular essas questões?

Vamos sustentar outra tese. A de que há indícios muito fortes de uma ação delituosa, que favoreceu um grupo de estudantes que não concorreu para o evento. Ninguém aqui considera que os estudantes tenham tomado parte nessa ação. Receberam o material, sem saber do que se tratava. Não se trata de punição. O que se busca é resgatar a isonomia das condições de acesso ao ensino superior.

Quais são esses indícios?

Hoje sabemos que essa escola foi sorteada para o pré-teste de 2010. E o material divulgado pela escola é a reprodução fiel de 2 dos 36 cadernos de pré-testes aplicados em outubro de 2010. Aquilo que a própria escola reconhece que divulgou para os alunos não são itens quaisquer, são dois cadernos de pré-teste. Não são itens memorizados aleatoriamente nem colhidos do mundo virtual.

Vem daí sua convicção? Ou já se avançou mais na investigação de quem pode ter conseguido ou distribuído as questões?

Temos depoimentos de estudantes dizendo que receberam (o “simulado”) da mão de professores da escola, que até mesmo recomendaram sigilo em relação ao material, em virtude do seu potencial de auxílio no exame. Estão chegando até nós, pelo 0800, com nome, CPF, depoimentos de alunos do colégio.

Para olhar o copo meio cheio, pelo menos o número de estudantes prejudicados tem caído ano a ano no Enem....

(Risos) O Enem precisa é ter um antídoto contra uma ação dessa natureza. Este é o terceiro episódio. Dois estão comprovados. No de 2009 (de vazamento da prova) já existe pena para o criminoso. No da fiscal de 2010, que passou o texto-base da redação para o filho, o processo criminal corre. E com o de agora seguirá na mesma linha.

Explique melhor para as pessoas o que é o pré-teste.

É o mecanismo pelo qual eu consigo atribui a cada questão um grau preciso, numérico, de dificuldade. A TRI (Teoria da Resposta ao Item, modelo matemático usado no Enem) pressupõe o pré-teste, para que provas diferentes sejam comparáveis entre si, aplicáveis até em dias diferentes. É praticamente uma prova por indivíduo.





Em Genebra, Fifa comemora queda de Orlando Silva

O Estado de S. Paulo - 28/10/2011

A Fifa comemora a queda de Orlando Silva e espera que agora seja acelerada a aprovação da Lei Geral da Copa. A entidade via o ex-ministro como obstáculo à organização do Mundial de 2014.

Oficialmente, a ordem é não interferir nos temas brasileiros para não causar mal-estar. O temor é que mudanças bruscas possam desestimular potenciais patrocinadores do evento. "Reconhecemos o trabalho feito até agora e lamentamos a situação", disse o secretário-geral da Fifa, Jerome Valcke.

Depois de romper com Orlando, Valcke disse ontem apoiar as decisões da presidente Dilma Rousseff. Antes de saber da escolha de Aldo Rebelo, ele dizia confiar em que "o governo brasileiro logo informará sobre seu representante", O Comitê Olímpico Internacional também minimizou a queda de Orlando. "Estamos confiantes que essa mudança não irá gerar impactos na preparação do Rio 2016", disse o comitê.







Uruguai derruba lei que anistiava autores de crimes durante a ditadura

O Estado de S. Paulo - 28/10/2011

O Congresso do Uruguai aprovou na madrugada de ontem um projeto de lei do governo que declara imprescritíveis os crimes cometidos durante a ditadura militar no país (1973-1985). A lei, que já passou pelo Senado, obteve votos a favor de 50 dos 90 parlamentares presentes na Câmara e deve ser sancionada hoje pelo presidente José Mujica. A Suprema Corte, no entanto, pode derrubar a decisão.

O decreto "restabelece o pleno exercício da pretensão punitiva do Estado para os delitos cometidos pelo terrorismo estatal até 1º de março de 1985" e afirma que não se aplicam prazos processuais de prescrição ou caducidade para julgamento desses crimes contra a humanidade.





Com a nova legislação, dizem governistas, a Lei de Anistia em vigor no Uruguai, de 1986, perde efeito e se cumpre a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que em março ordenou que o país investigasse delitos da ditadura. Todos os deputados da Frente Ampla, a coalizão de Mujica, votaram a favor do projeto.

A sessão foi tensa e durou 12 horas. Houve discussões ásperas entre parlamentares do governo e da oposição, para quem a nova lei passa por cima de dois plebiscitos, realizados em 1989 e 2009, no qual o fim da anistia foi rejeitado.

"Só os autoritários festejam um atentado contra a democracia", disse, por meio de sua conta no Twitter, a deputada Analía Piñeyrúa, do Partido Nacional.

Para o governo, a aprovação do decreto significa o fim da impunidade dos militares. "É uma noite histórica", declarou o deputado da Frente Ampla, Luis Puig.

O presidente José Mujica prometeu ratificar a decisão do Congresso, mas garantiu que a última palavra cabe à Suprema Corte. "Sou contra o uso do veto presidencial por princípio", afirmou ao jornal El País de Montevidéu. "Mas a Justiça terá de se pronunciar e cumpriremos o que ela decidir", acrescentou.

O projeto de lei foi submetido ao Congresso após um decreto similar ter sido derrotado na Câmara dos Deputados em maio. Se o Congresso não tivesse agido, as mortes e desaparecimentos da ditadura prescreveriam a partir do próximo dia 1.º.

"Mesmo sem essa lei, os juízes poderiam levar os crimes a julgamento. Mas caso algum deles entenda que o crime foi prescrito, as famílias das vítimas têm agora uma lei à qual apelar", explicou o senador governista Rafael Michelini.

Durante a ditadura no Uruguai, houve 34 mortos e 38 desaparecidos, enquanto na Argentina estima-se que 30 mil civis foram assassinados. Alguns militares uruguaios foram processados e presos, como foi o caso de Juan María Bordaberry, presidente militar entre 1973 e 1976, que morreu este ano.

A sociabilidade dos clubes

ROBERTO DaMATTA

O Estado de S.Paulo - 26/10/11

Nos clubes acontece uma forma de estar (e de ser) adequada às associação voluntárias - essas organizações nas quais entramos (e saímos) não por nascimento ou morte, mas por gosto, interesse e escolha. Num país como o Brasil, onde tudo que é escuso ocorre justamente nos espaços situados entre amizades, parentescos e, hoje, partidos e o "governo" que deveria ser impessoal e servir a todos, vale a pena falar um pouco de clubes e de sua sociabilidade. Ao fazer isso, inspiram-me os notáveis 190 anos da Sociedade Germania. Um clube fundado por alemães no Rio de Janeiro dos 1821, em pleno reinado de Pedro II.

Existe pouca reflexão sobre essas organizações. Uma rara exceção é o livro de Robert H. Lowie, Primitive Society (Sociedade Primitiva), publicado em 1921. Lowie, nascido em Viena e filho de mãe austríaca e pai húngaro, foi um daqueles imigrantes cujo estranhamento foi responsável por aquele atraente cosmopolitismo americano talvez por sua associação ser de um imigrante com os Estados Unidos. Imigrantes e expatriados são como sócios de um clube, muitas vezes, sócios sem carteirinha. Talvez por isso, ele tenha revelado que as chamadas sociedades "primitivas" também possuíam estruturas que congregavam pessoas por meio de critérios fora do parentesco e da família. Como especialista em sociedades indígenas da América do Norte, Lowie estudou esses "clubes" tribais sem escrita e lista de sócios, que uniam pessoas vinculadas por ensejos semelhantes, tal como fazem os nossos sindicatos, clubes, associações e partidos políticos. Em 1921, isso rompia com o evolucionismo de Morgan e de Engels, o qual estabelecia que todas as formas de sociabilidade humana tinham como origem a família e o clã.

* * * *

O destino levou-me ao Germania onde Margret Möller, sua presidente, chamou minha atenção para uma orgulhosa continuidade de quase dois séculos. Pertencer a duas sociedades simultaneamente é experimentar o humano de um modo radical, pois trata-se de construir uma ponte entre o "ser" e o "estar" - esses verbos misteriosos. Eles se entrelaçam (como ocorre em inglês) e se separam. Quem nasce num lugar é desse lugar. Os poetas (que podem dizer tudo) adornam os "naturais" do Brasil ou da Rússia com um elo fixo com a floresta, os índios, o sol, o calor tropical ou as estepes e o frio intenso. Mas, como mostram as viagens e os clubes, o humano vai além do "ser"; ele surge também no "estar". Somos de algum lugar, temos uma casa, mas estamos também nos clubes e nas relações que nos unem a outros mundos.

* * * *

O duplo ou o múltiplo pertencer nos torna mais humanamente contraditórios nas nossas desconcertantes identidades. Assim, Lowie foi um vienense-americano tal como os alemães que fundaram o Germania puderam continuar sendo alemães num Rio de Janeiro de monarcas, barões e escravos - uma cidade fechada para sociabilidades alternativas.

* * * *

Em São João Nepomuceno, Minas Gerais, vivi um intenso clubismo. Os clubes aos quais pertenci - o Mangueira e os Democráticos - eram brasileiros, mas a sua sociabilidade era tão gratificante quanto a que experimentei no Germania, quando fui gentilmente recebido por Margret Möller e alguns amigos do coração; ou a algum clube inglês numa Inglaterra que, dizem os ingleses, os inventou.

Qual o segredo dos clubes? Ora, seu ponto de atração está na alternativa que eles oferecem às nossas casas e famílias. Em casa somos determinados e não temos escolhas (nem piscina ou restaurante). Nos clubes ocorre justamente o oposto. Temos a escolha dos amigos e, em seguida, as facilidades que as pessoas comuns só podem ter quando se congregam em grupo - esse traço do igualitarismo que marca muitos sistemas tribais, mas que até hoje não é aceito no Brasil. Esse associacionismo "voluntário", descoberto por Alexis de Tocqueville no seu A Democracia na América, quando ele discerne como a igualdade política radical predispunha os americanos à congregação e a uma vida partidária que os compensava pela ausência do nome de família e de fortuna pessoal. Na França, isso não ocorria porque cada "estamento" ou "casa aristocrática" era uma miniatura da própria sociedade e todos sabiam com quem estavam falando, tal como até hoje ocorre no Brasil. Para Tocqueville, o clubismo e o partidarismo compensavam a igualdade e o individualismo da vida democrática.

* * * *

Nos clubes, experimentamos uma convivência marcada por uma ética da igualdade que nos obriga a relativizar a família com a sua sociabilidade hierarquizada, carimbada por sexo e idade. Neles, é complicado misturar parentesco (que não dá carteira nem ordena mensalidade) com um relacionamento que exige carteira, mas exclui o favor (com o seu dar e receber) - esse mestre dos sistemas com dois pesos e medidas. Em trabalhos acadêmicos, acentuei como o Brasil resiste a essas sociabilidades igualitárias, impessoais, baseadas em escolhas e compromissos sempre públicos - esse relacionamento clubístico e partidário, mais universalista do que particularista, íntimo e pessoalizado.

Viva, pois, um clube com quase dois séculos num Brasil em que a vida associativa fora da família tende a mudar de acordo com o messias ou, para não entrarmos na escuridão de nosso sistema político, a cada negócio.








Teorias conspiratórias (e histéricas)

CONTARDO CALLIGARIS

folha de sp - 27/10/11
O protagonista do novo (e ótimo) romance de Umberto Eco, "O Cemitério de Praga" (Record), é um falsário do fim do século 19.

Você, emissário de sei lá qual governo ou grupo, quer fomentar o antissemitismo, provando que os judeus conceberam um plano diabólico de domínio do mundo? Devidamente contratado, o falsário criará "Os Protocolos dos Sábios de Sião", prova cabal de um complô judaico. O texto, uma vez "descoberto", alimentará o antissemitismo mundo afora, durante décadas.
Hoje, a tecnologia digital facilita o trabalho dos falsários, e, graças à internet, um boato se transforma rapidamente numa certeza coletiva.
Mas, de qualquer forma, nunca foi muito árduo inventar conspirações ocultas e espalhar desconfiança e delírios segundo os quais os misteriosos "eles" estariam tramando na sombra. O fato é que o público adora uma teoria conspiratória.
Ou melhor, sejamos sinceros: em regra, adoramos entender o mundo como fruto de conspirações que tentam nos enganar. Por que será?
Uma resposta está no livro (já clássico) de Elaine Showalter, "Histórias Histéricas" (Rocco, esgotado -tente www.estantevirtual.com.br).
Showalter lembra que, para negar a existência e o surgimento de desejos sexuais em seus corpos e almas, as histéricas começam por atribuir esses desejos aos outros ou, como se diz, por projetá-los nos outros. Logo, elas fogem dos ditos outros (que se tornaram zumbis portadores dos desejos delas) ou os acusam de seduções e estupros.
Moral da história, a histérica pode dizer: 1) eu não desejo nada, sou e me mantenho pura, pois o sexo não vem de mim, mas dos outros, que querem me sujar e 2) eu sei quem o outro "realmente" é, sei quais desejos vergonhosos ele esconde atrás de sua aparência bem-comportada. Em suma, 3) posso negar que tenho desejos, não preciso me responsabilizar nem me envergonhar por eles e, além disso, pretendo saber desvendar o lado obscuro de qualquer um.
Desvantagem: assim fazendo, eu me afasto irremediavelmente de meu próprio desejo.
E os homens, nessa história? Segundo Showalter, sobretudo hoje, a histeria dos homens aparece, justamente, na crença em teorias conspiratórias: as meninas acham que os outros querem seduzi-las e violentá-las, e os meninos acham que os outros querem enganá-los e manipulá-los.
(Antes de continuar, uma nota: pode ser que imaginar teorias conspiratórias e acreditar nelas seja uma forma de histeria masculina, mas isso não significa que as conspirações não existam. Ao contrário, como mostra o romance de Eco, sempre existe, no mínimo, a conspiração dos que constroem e espalham teorias conspiratórias.)
Mas voltemos à histeria dos homens segundo Showalter. Eis quatro vantagens para os que gostam de conspirações escusas.
1) Quem entende o mundo à força de "desvendar" conspirações só pode se perceber como uma exceção: ele acredita ser o único, ou quase, que enxerga as tramas nefastas dos outros -o único ou um dos poucos que "eles" não estão conseguindo enganar.
2) Com a ideia de que sempre há outros que tentam nos manipular e controlar, a gente se oferece uma volta à infância e à relação com os pais. Há um prazer nostálgico na suposição de que haja adultos os quais, num conluio entre si, decidem nosso destino, sem nos explicar nem de longe o que realmente acontece.
Há um prazer nostálgico na ideia (infantil e pré-adolescente) de estarmos nas mãos de outros todo- poderosos e de sermos os únicos que, heroicamente, resistem à sua sedução e desvendam suas mentiras.
3) Uma hipotética conspiração, por mais hostil que ela nos seja, permite-nos confiar numa ordem do mundo -boa ou ruim. Se há intenções escondidas, nada ou pouco acontece por acaso, o mundo obedece a um plano -da divina providência, do demônio ou dos conspiradores, tanto faz: de qualquer forma, a existência de um plano é consoladora.
4) Para as histéricas, atribuir o desejo sexual ao outro é um jeito de negar sua própria sexualidade.
Para os homens não é muito diferente: a invenção de uma conspiração maléfica lhes permite ignorar seus próprios desejos "políticos" sombrios, os que eles preferem esconder de si mesmos.
Afinal, o conspirador, ao qual atribuo a vontade de me enganar e manipular, é quase sempre uma projeção, ou seja, é minha própria criação, à imagem e semelhança de mim.








quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Lei da Informação é vitória do cidadão contra o Estado, avalia historiador

Autor(es): Daniel Bramatti
O Estado de S. Paulo - 27/10/2011

*Entrevista: Marco Antonio Villa, historiador 

Para o historiador Marco Antonio Villa, a aprovação da Lei de Acesso às Informações Públicas é uma "vitória do cidadão contra o Estado". 

Como o senhor avalia a nova legislação? Temos uma tradição no Brasil de Estado forte e sociedade civil frágil. Houve uma inversão nessa aprovação. A lei dá ao cidadão um poder de fiscalização sobre o Estado que nós não tínhamos. Isso é muito importante e deve ser saudado. Foi uma vitória do cidadão contra o Estado. Como historiador, sua expectativa é de que se abra logo o acesso a documentos antigos? Uma questão chave é ver como será implementada a lei. Não pode ser uma lei só para inglês ver. O governo pode transformar tudo em ultrassecreto, e aí abrir só daqui a 50 anos. Isso seria um golpe. O acompanhamento da implementação da lei é tão importante quanto sua aprovação. Houve reações ao projeto no Senado... O ex-presidente Fernando Collor (de Mello) teme que se faça revelações ainda mais amplas sobre seu período na Presidência da República. O atual presidente do Senado, José Sarney, também colocou inúmeros obstáculos para a aprovação do projeto, porque quer evitar revelações sobre seu quinquênio no governo, que todos sabemos que foi desastroso. A lei é uma das mais avançadas que devem existir nas democracias ocidentais, mas o receio é a implementação. É preciso acompanhar de perto esse processo. Teremos de mudar hábitos péssimos da elite política brasileira, que não gosta de prestar contas aos cidadãos.

ESCOLA 'ANTECIPA' ENEM E 639 PROVAS SÃO ANULADAS; PF INVESTIGA SUBORNO

Escola 'antecipa' Enem e 639 provas são anuladas; PF investiga suborno
O Estado de S. Paulo - 27/10/2011

Educação. Suspeita é de que Colégio Christus, de Fortaleza, teve acesso há um ano a conteúdo de pré-teste, realizado pelo MEC para avaliar grau de dificuldade das questões que caem na prova; para ministro Fernando Haddad, "situação está administrável"


Um simulado realizado no Colégio Christus, de Fortaleza, dez dias antes da aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), apresentou nove questões idênticas à prova aplicada no fim de semana passado em todo o País. A informação foi antecipada pelo portal estadão.com.br. O Ministério da Educação (MEC) não crê em vazamento da prova após a impressão e suspeita que a escola tenha tido acesso a questões do pré-teste realizado em 2010. Os 639 alunos do colégio terão de refazer o exame.

O MEC acionou a Polícia Federal para investigar o caso. As nove questões estavam em pré-teste realizado em outubro do ano passado em cinco Estados, entre eles o Ceará. Uma das linhas de investigação da PF é de que um funcionário do Colégio Christus tenha subornado um fiscal que aplicou questões do pré-teste na escola e copiado o caderno.

A aplicação das questões ficou sob responsabilidade do consórcio formado pela Fundação Cesgranrio e FUB/Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe). No pré-teste foram distribuídos 16 cadernos de questões contendo 24 itens cada. Após a aplicação, os cadernos foram recolhidos, levados para Brasília, tabulados e incinerados.

O simulado realizado dez dias antes do Enem no colégio com as questões idênticas ao Enem é exatamente igual à prova de pré-testes - por isso, sequer tem logotipo do Christus. O MEC afirma não ter registrado sumiço do caderno. Em pré-testes realizados em anos anteriores, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) já chegou a cancelar questões do pré-teste por sumiço do caderno.

Todas as questões do Enem são testadas previamente em um grupo reduzido de estudantes, para determinar o grau de dificuldade. O exame é corrigido pela Teoria de Resposta ao Item (TRI), conjunto de modelos matemáticos que permite que estudantes com o mesmo número absoluto de acertos possam ter notas finais diferentes - a dificuldade desses itens são decisivas para a nota. Além disso, as questões pré-testes possibilitam que o exame possa ter uma comparação entre um ano e outro.

Facebook. O caso veio à tona depois que fotos do caderno de questões do simulado foram publicadas em um perfil no Facebook, na noite de terça-feira. Uma estudante de Fortaleza, que tem uma prima que estuda no Christus, já havia comentado nas redes sociais sobre a coincidência de questões na noite de sábado, primeiro dia de exame.

De acordo com o colégio, o simulado ocorreu dez dias antes do Enem. A escola publicou uma nota de esclarecimentos em seu sit. O texto afirma que, "como há o pré-teste de questões utilizadas no Enem, existe a possibilidade de que essas questões caiam no domínio público antes da realização oficial do exame, as quais eventualmente podem compor o banco de dados de professores e de outros profissionais da área de educação".

O Ministério Público Federal no Ceará vai recomendar que o Enem 2011 seja anulado em todo o País. O procurador da República Oscar Costa Filho soube do episódio por alunos que o procuraram. "É necessário que se imponha, de uma vez, a constitucionalidade no Enem, o que significa o direito de candidatos que se sentirem prejudicados recorrer", disse. Ele acha injusto que só os estudantes do Christus tenham de refazer a prova, porque eles podem ter passado as questões para outras escolas.

Os 639 alunos do Christus farão o novo exame nos dias 28 e 29 de novembro, quando a prova também será aplicada a presidiários de todo o País. "A situação está administrável", disse o ministro Fernando Haddad à noite, ao sair do MEC. Ele entrou no carro e foi embora sem responder se considerava o exame deste ano um sucesso, apesar do episódio de Fortaleza. / CEDÊ SILVA, CARLOS LORDELO, PAULO SALDAÑA, CARMEN POMPEU, MARIANA MANDELLI, RAFAEL MORAES MOURA

Educação no Brasil evoluiu, diz Prêmio Nobel

Autor(es): Por Diogo Peixoto | Do Rio
Valor Econômico - 27/10/2011


A educação brasileira evoluiu e está mais voltada para a infância, avalia James Heckman, vencedor do Prêmio Nobel de Economia no ano 2000. Ele não vinha ao Brasil havia dois anos, e ontem participou do seminário "Educação das crianças na primeira infância: a experiência brasileira e internacional", ^que foi organizado pela Escola de Pós-gradução em Economia da Fundação Getulio Vargas (EPGE/FGV), no Rio de Janeiro.

Na avaliação do economista, especializado em educação, o fato de o Brasil preocupar-se agora mais com a educação infantil - que engloba as crianças de até cinco anos de idade - é fruto de um progresso natural, no qual as escolas passam a ser o foco de ação governamental na área educacional, ao contrário do que ocorria antes, quando o ensino superior era o alvo prioritário do governo.

"No passado, os esforços brasileiros eram concentrados no ensino superior, nas universidades públicas", afirmou Heckman, que leciona na Universidade de Stanford, na Califórnia, Estados Unidos.

Para ele, o governo brasileiro precisa pensar e elaborar a educação infantil de forma integrada com outras áreas, incluindo na formulação das políticas públicas educacionais a saúde e a segurança pública.

Heckman também defende a ideia de que o governo brasileiro precisa tomar medidas para alterar as regulações de pesquisa, de maneira a incentivar parcerias entre instituições de ensino ou pesquisa públicas e empresas privadas.

"Nos Estados Unidos, você vê farmacêuticas trabalhando junto com empresas de informática e universidades. Há várias parcerias entre as companhias instaladas no Vale do Silício e a Universidade de Stanford", afirmou.

Na visão de Heckman, o Brasil possui boas universidades, que poderiam alavancar as pesquisas, colocando o país no mapa mundial da ciência. "O Brasil poderia ter um forte impacto na indústria de pesquisa, porque há ótimas universidades e centros de pesquisa aqui", disse.

Senado aprova criação da Comissão da Verdade

Autor(es): agência o globo:Evandro Éboli
O Globo - 27/10/2011
 BRASÍLIA


Projeto que permite investigar crimes da ditadura vai à sanção da presidente; colegiado não terá poder de punição. O Senado aprovou ontem, por unanimidade e em votação simbólica, o projeto que cria a Comissão da Verdade, que deverá ser instalada ainda este ano. Agora, o projeto vai à sanção da presidente Dilma Rousseff. A sessão que aprovou a comissão durou cerca de quatro horas, e vinte senadores, da oposição e do governo, discursaram a favor do relatório do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), um ex-militante de esquerda e que durante a ditadura atuou na luta armada. Após a aprovação, os senadores comemoravam o resultado com ex-perseguidos e familiares de desaparecidos que acompanharam a sessão. A Comissão da Verdade será composta por sete integrantes, escolhidos pela presidente da República, e terá um prazo de dois anos para funcionar. A missão da comissão é levantar informações sobre mortes, torturas, desaparecimentos, apontar locais onde ocorreram essas violações contra os direitos humanos e identificar responsáveis. O colegiado terá poderes até mesmo de convocar os depoentes, mas não poderá punir. No seu relatório, Aloysio Nunes, por três vezes, afirmou que os agentes do regime criaram uma "máquina de matar" e um dos objetivos da comissão é detalhar como funcionava e onde. O senador reafirmou que o grupo não terá poderes juriscidionais, ou seja, não poderá punir responsáveis identificados por esses atos. - Não se admite na democracia um tribunal de exceção. Essa função é do Poder Judiciário. As informações ali levantadas podem até ser enviadas para a Justiça para os que sentirem atingidos - disse Aloysio Nunes. O relator disse também que o golpe militar teve a colaboração de civis: - Civis participaram. Médicos-legistas que serviram ao regime atestavam que pessoas que morreram em sessões de torturas e assassinados friamente morreram em combate. O que era uma mentira - disse. Apesar de o texto aprovado prever a apuração de violações cometidas desde a ditadura de Getúlio Vargas, na década de 40, Aloysio defendeu que as investigações se concentrem no regime instaurado a partir de 1964, em especial após a edição do AI-5, que cassou mandatos, fechou o Congresso, perseguiu opositores, torturou e desapareceu com militantes de esquerda. Foi o endurecimento do regime, conhecido como golpe dentro do golpe. A sessão foi presidida pela senadora Marta Suplicy (PT-SP), que, ao proclamar a aprovação, comentou. - A presidente terá uma noite bastante feliz. Presente à sessão, a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, comentou o resultado: - A criação da Comissão da Verdade é um tributo aos que lutaram e, generosamente, ofereceram suas vidas por essa causa - disse a ministra.

Escravidão sem fim

Autor(es): agência o globo:Geralda Doca

O Globo - 26/10/2011

OIT diz que Bolsa Família e fiscalização não conseguiram vencer o trabalho degradante





Oprincipal programa de transferência de renda do governo, o Bolsa Família, e a fiscalização não têm sido suficientes para extirpar o trabalho escravo no Brasil. Estudo divulgado ontem pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) traçou, pela primeira vez, o perfil das vítimas do trabalho escravo no país. Elaborado a partir do depoimento de 121 trabalhadores resgatados entre 2006 e 2007, o estudo mostrou a baixa escolaridade dos resgatados e a falta de ações para criar oportunidades nas regiões que mais fornecem este tipo de mão de obra.

Em 67% das famílias de trabalhadores libertados, existiam crianças e adolescentes, sendo que 28% (quase um terço) delas eram beneficiárias do Bolsa Família. O levantamento revelou também que quase 60% dos trabalhadores resgatados no país já foram escravizados antes e que a fiscalização do governo conseguiu libertar apenas 12,6% do universo de trabalhadores nestas condições, de acordo os dados do Ministério do Trabalho.

A pesquisa apontou forte relação entre trabalho escravo e infantil no país: 92,6% do total de entrevistados começaram a trabalhar antes dos 16 anos. Na média, aos 11,4 anos, mas cerca de 40% já trabalhavam antes.

Segundo Luiz Antonio Machado, coordenador do projeto da OIT de combate ao trabalho escravo no Brasil, o Bolsa Família ajuda a reduzir a vulnerabilidade dos trabalhadores porque melhora a alimentação das famílias. Mas, por si só, não evita que os chefes dessas famílias se submetam a condições degradantes de trabalho, com cerceamento de liberdade - o que caracteriza o trabalho escravo.

- O Bolsa Família é insuficiente e a fiscalização não consegue cobrir todo o país ou mesmo os estados com maior concentração (da irregularidade) - afirmou Machado.

Agropecuária concentra trabalho escravo

Machado destacou que o alto índice de recorrência - 59,7% dos resgatados já haviam estado na situação de escravidão anteriormente - deve-se à falta de alternativas, restando aos trabalhadores sem qualificação nas áreas rurais apenas a "empreitada", que exige só força física. Segundo ele, também é preciso investir em campanhas de conscientização frequentes para estimular os próprios trabalhadores a fazerem a denúncia. Na maioria das vezes, eles são liberados no fim da empreitada sem receber pelo serviço.

A renda média declarada desses trabalhadores foi de 1,3 salário mínimo, sendo que 40% informaram ser o único responsável pela renda das famílias que têm, em média, 2,4 filhos.

Ele defende a necessidade de ações complementares para tornar as politicas mais efetivas. Entre elas, estimular a criação de empregos nos locais de residência dos trabalhadores e oferecer cursos de capacitação profissional.

De acordo com a pesquisa, 85% dos trabalhadores entrevistados, além de terem baixíssima escolaridade (analfabetos e com menos de quatro anos de estudo), nunca fizeram curso de qualificação. No entanto, 81,2% declararam que gostariam de fazer algum curso, principalmente os mais jovens (95,2% dos que têm menos de 30 anos). A preferência recai nas áreas de mecânica de automóveis, operação de máquinas, construção civil (pedreiro, encanador, pintor) e computação.

Maranhão, Paraíba e Piauí são os exportadores de mão de obra escrava para outros estados. Eles estão entre as principais origens dos trabalhadores resgatados em Goiás (88%) e no Pará (47%). No Mato Grosso e na Bahia, 95% deles eram da própria região.

Segundo a OIT, a agropecuária continua sendo o setor de maior concentração de trabalho escravo, sobretudo nas fazendas de cana-de-açúcar e produção de álcool, como é o caso do Pará; plantações de arroz (Mato Grosso); culturas de café, algodão e soja (Bahia); e lavoura de tomate e cana (Tocantins e Maranhão).

Segundo a pesquisa, o aliciamento se dá, na maioria dos casos, pela rede de relações pessoais; os "gatos" (aliciadores) e escritórios que funcionam como agências de emprego aparecem em segundo lugar. Em terceiro estão hotéis, pensões e locais públicos, como rodoviárias, estações de trem e ruas das cidades.

O conceito de trabalho escravo apontado pela OIT considera, além das condições precárias (falta de alojamento, água potável e sanitários, por exemplo), cerceamento à liberdade pela presença de homens armados, dificuldades de acesso às fazendas e dívidas contraídas de forma forçada pelos trabalhadores para pagar alimentação e despesas com ferramentas usadas no serviço.

O Ministério do Trabalho informou que a pasta não comentaria a pesquisa porque o responsável pela área de fiscalização estava incomunicável ontem.

Orlando na Estação Finlândia

DEMÉTRIO MAGNOLI

O GLOBO - 27/10/11

O governo cedeu à máfia chamada Fifa no principal, que é a legislação de licitações, mas simula uma resistência em temas periféricos





A Igreja da Libertação anunciou uma opção preferencial pelos pobres. O PCdoB definiu uma opção preferencial pelo Esporte. Brasil afora, nas esferas federal, estadual e municipal, o partido almeja o controle do ministério e das secretarias do Esporte. Não é o Homem Novo, mente sã em corpo são, que os comunistas fiéis à herança stalino-maoísta pretendem fabricar. A preferência obsessiva obedece a uma estratégia centralizada de financiamento do aparato partidário com dinheiro público. O jogo funciona assim: os gestores públicos do partido repassam recursos a ONGs de fachada, administradas por militantes subordinados ao partido, que pagam pedágio ao partido. Orlando Silva não é uma ilha isolada, mas apenas o ponto focal de um arquipélago assentado sobre uma vasta plataforma submarina.

O Ministério do Esporte funciona como duto de desvios ilegais de dinheiro público para recipientes particulares. As eventuais responsabilidades criminais do ministro só podem ser estabelecidas no curso de um processo, mas suas responsabilidades políticas estão à vista de todos. Por menos, caíram os ministros Antonio Palocci (PT), Wagner Rossi (PMDB), Pedro Novais (PMDB) e Alfredo Nascimento (PR). Qual é o motivo da longa sobrevida de Orlando Silva?

O governo cedeu à máfia chamada Fifa no principal, que é a legislação de licitações, mas simula uma resistência em temas periféricos, como a meia-entrada e as proibições estaduais à venda de cerveja nos estádios. O PCdoB e a camarilha de porta-vozes informais financiados pelo lulismo na internet exibem Orlando Silva como um paladino da luta contra Joseph Blatter e seus asseclas nativos. A patética encenação só ilude os tolos: se Dilma Rousseff quisesse proteger a soberania nacional das forças de ocupação da Fifa bastaria declarar que as leis do país não estão em negociação.

Agnelo Queiroz comandou o Ministério do Esporte, tendo seu correligionário Orlando Silva como secretário-executivo, antes de trocar (ao menos formalmente) o PCdoB pelo PT e se eleger governador do Distrito Federal. Toda a meada do esquema de desvios de recursos, cujas raízes se encontram na gestão de Queiroz, poderia ser desenrolada a partir da demissão do atual ministro. Nos bastidores, circulam ameaças de exposição do governador na trama de seu antigo partido. A extensão das repercussões do escândalo é uma causa circunstancial, secundária, da resiliência de Orlando Silva.

O PT inscreveu-se na paisagem política brasileira como desaguadouro recente da tradição da esquerda. A marca de origem, sua fonte insubstituível de legitimidade, reflete-se na aliança histórica com o PCdoB, o único remanescente significativo da árvore do “socialismo real” no país. Hoje, o PT faz coligações com qualquer partido conservador disposto a intercambiar seu apoio ao projeto de poder petista por cargos no aparato estatal. Contudo, justamente por compartilhar os palácios com Sarney, Barbalho, Calheiros, Collor et caterva, o PT precisa conservar a narrativa mitológica que desempenha funções identitárias cruciais. Os congressos petistas devem mencionar o “socialismo” com ênfase tanto maior quanto mais próximo do grande empresariado estiver o governo. A aliança com o PCdoB deve ser preservada mesmo à custa da imagem de “faxineira da corrupção” construída pela presidente em desgastantes atritos com o PMDB e o PR. As motivações simbólicas são a liga do sólido alicerce que sustenta Orlando Silva.

Uma conferência estadual do PCdoB, no Rio de Janeiro, sexta passada, serviu como palco para a articulação partidária em torno da defesa do ministro. No evento, em meio a cartazes de protesto contra a “mídia golpista”, o presidente do partido Renato Rabelo comunicou que recebera um telefonema no qual Lula transmitiu o grito de guerra: “Vocês têm que resistir, o ministro tem que resistir”. O ex-presidente expressou solidariedade prévia a todos os ministros afastados do governo Dilma sob suspeitas de corrupção, mas em nenhum dos casos anteriores operou como agitador público. No affaire Orlando Silva, ele não age em proveito de uma personalidade ou um partido, mas no interesse de um princípio político.

A corrupção estatal tem a finalidade invariável de produzir fidelidades políticas, soldando um bloco de poder. No Brasil, a corrupção tradicional se realiza na moldura arcaica do patrimonialismo, transferindo dinheiro dos cidadãos para o patrimônio de particulares. O lulo-petismo aprendeu a conviver harmoniosamente com esse padrão de corrupção, mas tende a desprezá-lo. Poucas vozes se ergueram em defesa de Palocci, suspeito de traficar influência para multiplicar seus bens privados. Em compensação, o poder lulo-petista estimula uma nova modalidade de corrupção: a transferência de recursos públicos para partidos e entidades que prometem conduzir o povo ao porto do futuro. Segundo a tese implícita, a administração do Estado deve se subordinar ao primado da política, traduzida como um movimento rumo à realização de uma verdade histórica superior. Obviamente, as engrenagens da corrupção de novo tipo também enriquecem operadores tradicionais, mas tal fenômeno é interpretado como um dano colateral inevitável.

De volta do exílio, em abril de 1917, Lenin desembarcou do vagão de um trem na Estação Finlândia, em Petrogrado, para anunciar a chegada da revolução proletária. Há tempo, o PCdoB renunciou de fato ao socialismo. Entretanto, fatos não importam nos domínios da mitologia política. Numa mensagem à conferência do PCdoB, Orlando Silva mencionou a guerrilha do Araguaia e citou uma carta do poeta stalinista Pablo Neruda ao PC chileno: “Neste momento, me sinto indestrutível, porque contigo, meu partido, não termino em mim mesmo”. O ministro faz parte dos homens da Estação Finlândia. Por isso, o lulo-petismo tentou declará-lo “indestrutível” e sua demissão decorreu da intervenção do STF.

Demétrio Magnoli é sociólogo e doutor em Geografia Humana pela USP.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Cristina na cabeça

Autor(es): Gianni Carta

Carta Capital - 24/10/2011

De Buenos Aires





Cristina fernández de Kirchner adentrou o palco do Teatro Coliseo na quarta-feira 19, em Buenos Aires, com olhar de vitória. Confetes celestes e brancos, as cores da bandeira argentina, choveram na candidata do Partido Peronista para a presidencial deste domingo 23. Na plateia apinhada a prestigiar a futura presidenta no encerramento da sua campanha na capital, ministros, governadores, dirigentes da central operária CGT e as Mães e Avós da Praça de Maio a aplaudiram de pé.

A certeza de Cristina, como é conhecida, na reeleição tem fundamento. Neste país- alheio a um sistema estruturado de partidos políticos, a oposição, incapaz de selar alianças, está fragmentada. Além do mais, após as primárias de 14 de agosto, legendas foram impedidas de formar coalizões, de acordo com a legislação em vigor. Nesse quadro pouco atraente, oposicionistas, os candidatos à Presidência, incluindo o socialista Hermes Binner, mais bem colocado segundo pesquisas de intenção de voto, contentam-se com um segundo lugar – em miúdos, meros 15% dos votos, se muito.

E, como é sempre o caso, a maior força de um candidato é uma economia bem engrenada, caso, pelo menos na aparência, da Argentina sob Cristina. Com crescimento do PIB de 9,2% em 2010, os argentinos "creem que a economia vai de vento em popa", diz Adrian Ventura, articulista do diário conservador La Nación, para CartaCapital. O povo consome como se estivesse rico, emenda Ventura. Mas, infelizmente, não se dá conta de que está protegido, pelo menos por ora, por meios de transferências, subsídios e acordos salariais generosos.

O futuro de Cristina no poder parece ser, por ora, tranquilo, de forma geral o argentino parece preferir não mexer no time enquanto ele vence. Em miúdos, foca-se no curto prazo. Essa linha política, de qualquer forma, parece render frutos para objetivos eleitorais. Pesquisas de intenção de voto, apontam, já no primeiro turno, a vitória de Cristina, com entre 51% e 55% dos votos. "A questão não é se Cristina vai ganhar, mas por quantos votos a mais ganhará de seus adversários", sintetiza Alfredo Catoira, diretor de informática da Corte Suprema de Justiça, de 60 anos.

Educação na ponta do lápis

Autor(es): Fabíola Perez

Isto é - 24/10/2011

Com o início do período de matrícula escolar, especialistas explicam como planejar melhor o orçamento destinado ao ensino da família



Investir em educação vai muito além de pagar as mensalidades escolares. As despesas envolvem taxas de matrícula, material de papelaria, livros didáticos e uniformes, para citar os gastos mais comuns. De acordo com a coordenadora da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), Maria Inês Dolci, os custos não devem comprometer mais de 20% do orçamento mensal – limite nem sempre fácil de ser respeitado pelos pais. Para quem estava com as contas apertadas, a situação pode ficar mais complicada. Em 2012, as escolas querem reajustar as mensalidades entre 8% e 10%, quase o dobro da inflação prevista para o ano que vem. Como não comprometer o orçamento? "A dica é criar um fundo de reserva para destinar parte da renda extra, como 13º e bônus pagos pelas empresas", diz Sérgio Dal Sasso,economista da FEA-USP. "Assim, você evita problemas e não corre o risco de comprometer a continuidade da educação." Confira a seguir como planejar melhor a educação dos filhos.

Quanto mais prova, melhor

Veja - 24/10/2011

Pela primeira vez, uma pesquisa investiga a eficácia das avaliações do ensino no Brasil. Conclusão: o sistema é bom, mas falta usa-lo mais em prol da excelência.





Tudo o que se sabia sobre a educação brasileira até a década de 80 era fruto dos censos demográficos divulgados a cada dez anos e de estimativas imprecisas. Não havia sequer consenso sobre o número de escolas no país - variava de 190000 a 230000, dependendo da fonte. Foi só a partir de 1990 que o Brasil estreou no mundo das avaliações do ensino, com a criação do Saeb, a primeira das provas aplicadas pelo Ministério da Educação para diagnosticar as mazelas escolares. Desde aí, surgiram centenas de aferições municipais, estaduais e federais, do nível fundamental ao superior. Já é possível, por exemplo, comparar o grau de aprendizado em um minúsculo município brasileiro ao de escolas da Coréia do Sul. Até hoje, no entanto, pouco se estudou o uso prático desse gigantesco universo estatístico. A primeira pesquisa nacional do gênero, conduzida pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em parceria com a Fundação Victor Civita, acaba de ser concluída. O foco é o ensino básico. Coordenador do levantamento, o inglês Nigel Brooke, da UFMG, resume a ideia geral: "O Brasil já conseguiu colocar de pé um sólido sistema para medir o nível da educação, mas falta aprimorá-lo e usá-lo de forma mais eficiente na rotina escolar".

O trabalho, que consumiu um ano, chama atenção para a necessidade de criar alternativas nos estados e municípios às provas oficiais do MEC. É consenso que o conjunto de avaliações federais - cujo carro-chefe, por sua abrangência, é a Prova Brasil - funciona como um bom termômetro da qualidade, permitindo comparar estados, municípios e até escolas ao longo de décadas. Só que, segundo enfatiza a pesquisa, é difícil transformar esses grandes diagnósticos em um plano objetivo para avançar na sala de aula. Antes de tudo, porque a divulgação dos resultados pelo MEC custa a sair - às vezes quase dois anos, como ocorreu na última Prova Brasil. É tempo valioso que os colégios perdem em voo cego, sem o mapa das deficiências na mão. A pesquisa lança luz ainda sobre uma fragilidade pouco comentada acerca dos termômetros do ensino do MEC: muitas vezes, a amostra de alunos testados nas escolas é pequena para que se produza a partir dela um indicador capaz de espelhar a realidade com todas as suas nuances.

O estudo também lembra que não existe no Brasil um currículo nacional unificado - a matéria ensinada varia muito de uma rede de ensino para outra. Nesse sentido, produzir diagnósticos mais localizados, feitos sob medida para cada lugar, pode ser de grande valor.

"Quanto mais aproximado for o retrato da sala de aula, melhor ele servirá para subsidiar os professores sobre as lacunas que devem atacar", reforça Maria -Helena Guimarães, que esteve à freme do Inep, o Instituto Nacional De Pesquisas Educacionais do MEC, entre 1994 e 2002. Nos últimos cinco anos, começaram a crescer no país as avaliações estaduais do ensino: hoje, dezesseis dos 27 estados já têm uma. Um grupo minoritário, que inclui São Paulo, Minas Gerais e Ceará, faz uso bem prático dos resultados, traçando a partir deles metas e políticas de bônus para as equipes daquelas escolas que as atingirem.

Uma das mais relevantes contribuições que tais termômetros dão ao ensino é expor não só aos educadores, mas também a pais e estudantes, a verdadeira situação das salas de aula. Só assim eles podem fazer uma escolha bem embasada de uma determinada escola e exercer o papel decisivo de fiscalizar e cobrar avanços. Isso é coisa recente. No princípio, esses medidores da educação frequentemente não vinham a público, sobretudo aqueles feitos na esfera estadual. Ficavam confinados nas repartições, tratados como meros instrumentos internos de gestão. A falta de transparência traduzia o corporativismo de uma classe de educadores que sempre repudiou as comparações. Se isso não foi de todo superado, o novo estudo mostra de forma enfática que o Brasil já conta com um valioso diagnóstico sobre o ensino. Resta fazer desse gigantesco banco de dados um permanente aliado na busca pela excelência.

Acrobacias para ensinar
A premiada professora que levou o circo às crianças

A mineira Fernanda Pedrosa, de 30 anos, é uma professora de educação física pouco convencional. Em suas aulas, as mais disputadas no colégio municipal José de Calasanz, na periferia de Belo Horizonte, vê-se mais do que futebol ou vôlei: ali, ela ensina exercícios de circo. E não de qualquer um. Fernanda tem como fonte de inspiração nada menos que o canadense Cirque du Soleil. Nunca assistiu a um espetáculo de perto, só em vídeos - mas de forma exaustiva. Já decorou quase todos os malabarismos e acrobacias. Ensina os mais básicos a 130 alunos de 6 a 11 anos. Onze deles são portadores de deficiência física ou mental, situação com a qual Fernanda lida de forma exemplar. Com adaptações bem simples, como elevar a corda de pular para que um estudante em cadeira de rodas possa passar ao outro lado e entrar na brincadeira, ela conseguiu integrar a todos. Foi se quebrando aí, segundo relatos dos próprios alunos, o preconceito. Também se renovou o ânimo das crianças para com o colégio. A lição acabou derivando para pesquisas sobre animais e arte circense, fora do turno escolar. "Não esperava tanto impacto", diz Fernanda, grávida de sete meses, mas ainda à frente de suas aulas (embora, evidentemente, longe dos trapézios).

Na semana passada, o trabalho lhe rendeu o Prêmio Educador Nota 10, concedido a dez professores, além de um diretor, que se distinguiram pela excelência no ensino básico. O prêmio, criado em 1998, sempre dá destaque a um dos vitoriosos. Foi o caso de Fernanda. O fato de ter sobressaído em meio a 3000 candidatos faz refletir sobre os caminhos que encontrou para atrair crianças pobres e desprovidas de incentivos. Ela não se paralisou diante das lacunas de infraestrutura. Ao contrário, improvisou um circo com velhos tatames, cordas e bambolês. Debruçou-se sobre o projeto que sonhava implantar na periferia de Belo Horizonte com a obsessão de quem quer oferecer o melhor. Ela festeja: "Alguns de meus alunos já conseguem fazer números como os acrobatas do Cirque du Soleil". _

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Ciência e educação


Autor(es): Ruy Martins Altenfelder Silva
Correio Braziliense - 24/10/2011

Presidente do Conselho Diretor do CIEE Nacional e do Conselho de Administração do CIEE, presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas
É fácil notar certo deslumbramento com o crescimento econômico e a importância que o Brasil vem ganhando no cenário internacional. Com a crise econômica na zona do euro e a instabilidade político-econômica nos Estados Unidos, o mundo passou a olhar com atenção para as perspectivas promissoras dos países do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Mas aqui volta e meia impõe-se uma velha dúvida: até que ponto a nação está preparada para desempenhar o tão sonhado protagonismo mundial? Sétima economia mundial, com potencial para subir no ranking nos próximos anos, o Brasil permanece num modesto 13º lugar no tocante à produção científica. Mais negativo, ainda, é o dado sobre a corrida pelas patentes, indicador de inovação científica e tecnológica de um país. Segundo o Relatório Mundial da Ciência da Unesco, a participação brasileira não passa de 0,1% do volume mundial.

A ciência é a base para o desenvolvimento social, político e econômico de uma nação. A palavra vem do latim — scientia significa conhecimento — e faz parte do esforço de descobrir e aumentar o conhecimento humano sobre a própria realidade, com o objetivo final de trazer bem-estar, resolvendo as mazelas da sociedade. Portanto, está intimamente ligada à educação de qualidade, sem a qual não existe. Sem ciência, não há desenvolvimento. Portanto, é legítimo concluir que, sem educação de qualidade, não há inovação nem desenvolvimento sustentável.

Em contraponto aos indicadores saudáveis, a conjuntura atual revela perigosos efeitos da ausência de um sistema educacional organizado e apto a formar as novas gerações — tanto para o trabalho quanto para o exercício pleno da cidadania, com seus direitos e deveres. Um dos mais preocupantes é a falta de mão de obra qualificada para dar sustentabilidade ao desenvolvimento, um gargalo já perceptível em poucos anos de retomada do crescimento. Faltam profissionais de tecnologia da informação (TI) nas empresas que atuam em setores de ponta. Faltam professores para o ensino das ciências no nível básico, em matérias fundamentais, como matemática, física e química. Faltam engenheiros civis para o boom da construção civil e para tocar os projetos de modernização da infraestrutura do país. E por aí vai.

A carência de profissionais qualificados pode parecer um problema distante dos bancos escolares do ensino básico. Mas não é. Para que o país cresça de forma sustentável, é necessário investir em educação de qualidade desde os primeiros anos de aprendizado e, gradativamente, abrir espaço para cursos que se aproximem das demandas dos setores produtivos, em especial os estratégicos para o desenvolvimento nacional. Paralelamente, há que se estimular a produção científica, diminuindo a burocracia e aumentando os recursos destinados à pesquisa e ao desenvolvimento (P&D). Nos Estados Unidos, 76% desses investimentos vêm da iniciativa privada. No Brasil, a maioria dos recursos sai dos cofres públicos e o investimento é tímido, se comparado aos indicadores mundiais. O Brasil investe em torno de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em P&D, inferior à média de 2,28% dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Os dados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) situam o Brasil entre os piores países do mundo em desempenho escolar, atrás de países como Bulgária e Romênia, e dos latinos México, Chile e Uruguai. Um dos fatores para esse péssimo resultado é a chamada educação recorrente. Como no nível anterior o aluno não aprendeu o que deveria, o nível seguinte é prejudicado e assim segue, até se chegar ao nível superior com enormes lacunas de conhecimento a serem recuperadas, o que quase sempre não acontece.

O descaso com o ensino parece já estar embutido em largos círculos da própria sociedade. A começar pela desvalorização do professor, vítima de desrespeito por parte dos alunos e suas famílias, das deficiências da gestão escolar, dos baixos salários, da carência de programas de reciclagem e treinamento — para ficar em apenas um dos aspectos do problema. Mas, felizmente, ainda há muitos mestres dedicados à nobre vocação de ensinar. É para homenagear esses heróis da sala de aula que o CIEE criou, há 15 anos, o prêmio Professor Emérito – Guerreiro da Educação. Neste ano, a homenageada é a médica Angelita Habr-Gama, coloproctologista que se destacou como professora titular da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e, por suas pesquisas pioneiras, tornou-se referência mundial em sua especialidade. Generosa, destinou parte das atividades a difundir seus saberes, formando várias gerações de médicos especialistas. Aos 80 anos, continua na ativa e agora ingressa na galeria dos Guerreiros da Educação, que já conta com colegas homenageados em anos anteriores: Adib Jatene e Luiz V. Decourt, mestres e inovadores reconhecidos na área de cirurgia cardíaca. Lição exemplar de amor ao ensino e à ciência, digna de ser transmitida às novas gerações.

Por que roubam os comunistas?

EUGÊNIO BUCCI
REVISTA ÉPOCA
Em 1989, aos 26 anos, o cineasta Steven Soderbergh ficou famoso com Sexo, mentiras e videotape. Duas décadas depois, lançou Che, um épico dividido em duas partes, ou dois filmes em sequência: no primeiro, Che Guevara vira guerrilheiro em Cuba; no segundo, ele vai para a Bolívia instalar um foco revolucionário. No primeiro, Che sai consagrado, aos 30 anos. Do segundo, saiu morto, carregado por um helicóptero.

A cena final do primeiro filme é inesquecível. Pode ser vista como um trailer do pesadelo ético que a esquerda viveria na América Latina a partir de então. O protagonista Che Guevara (Benicio del Toro) vai pela estrada, dentro de um jipe sem capota, na direção de Havana. É janeiro de 1959. O ditador Fulgencio Batista fugiu. Fidel Castro venceu. De repente, passa pelo jipe um vistoso conversível, dirigido por um dos comandados de Che. No automóvel, moços e moças festejam, cabelos ao vento. Che ordena que parem. “Que carro é este?”, pergunta ao motorista. “Era de um francoatirador”, diz ele. O comandante se enfurece. Manda que seu subordinado volte, devolva o carro e só depois vá para Havana, a pé, se for preciso.

A mensagem do líder era simples e direta: a revolução não era um movimento de ladrões.

Na biografia que John Lee Anderson escreveu sobre Guevara, há uma passagem parecida. De novo, estamos às voltas com automóveis. Agora, Che é ministro das Indústrias, no regime comunista de Havana. Certo dia, seu vice-ministro, Orlando Borrego, aparece na repartição com um Jaguar esporte, novinho, que encontrara numa fábrica. O chefe o interpela aos palavrões e o obriga a devolver o carro. Borrego passaria os 12 anos seguintes dirigindo um Chevy mais simples, sem opcionais. Outra vez, a mesma mensagem: a revolução não admite ladrões.

Acontece que a História (com “H” maiúsculo, como alguns preferem) não é heroica. Ela é uma piadista. Quando morreu pelas armas dos militares bolivianos, Che estava magro e doente. E os ladrões proliferaram nas fileiras de esquerda. Rechonchudos e felizes. Não roubaram apenas automóveis, mas utopias. Transformaram sonhos dos camaradas em butim. Estão por aí, de terno, gravata e dinheiro vivo dentro de casa. Nisso se resume o grande dilema existencial e político das organizações de esquerda.


Comunistas, quando corruptos, roubam a razão pela qual morreram todos os guerrilheiros

Ao se acovardar diante da corrupção ou, pior, ao julgar que podem se extrair vantagens táticas da corrupção, um partido de esquerda abdica de acreditar na igualdade de oportunidades. Logo, abdica de sua herança simbólica e de nomes como Che Guevara. É bem verdade que Che se tornou um homem embrutecido, violento, comandando execuções às centenas, sem processo justo. O lendário guerrilheiro foi, a seu modo, um misto de verdade e de loucura (“tanta violência, mas tanta ternura”). Fez sua guerra, sujou as mãos de sangue e topou pagar o preço de sua escolha. O que importa, agora, é que ladrão ele não foi. E isso importa porque não foi a selvageria da batalha que corrompeu a esquerda: foi o roubo.

Passemos ao Brasil de 2011. Passemos para hoje. Estamos aí atordoados com mais um escândalo, outra vez embaralhando ONGs, mas agora com militantes e ex-militantes do PCdoB e autoridades do Ministério dos Esportes. Passarão meses, talvez anos, até que saibamos quem de fato tem culpa no cartório, se é que o tabelião e os cartorários não estavam no esquema. Desde já, porém, sabemos que há milhões e milhões de reais em irregularidades, tudo em nome de dar assistência a crianças carentes que não recebiam assistência nenhuma.

A corrupção virou a pior forma de barbárie de nossa democracia não apenas porque mercadeja com o destino de crianças ou porque sacrifica vidas em hospitais imundos e estradas abandonadas, mas principalmente por ter transformado a política numa indústria complexa, cuja finalidade é a apropriação da riqueza de todos para fins privados (e fins partidários são fins privados). Na esquerda, a corrupção se qualifica: emprega métodos bolcheviques e se justifica sob licenças ideológicas que enaltecem o crime comum como se ele fosse a própria trilha de libertação dos oprimidos. É uma corrupção delirante, que se julga uma nova modalidade de guerrilha contra o capital, mas que, no fundo, presta serviços ao que há de pior no capital.

Comunistas e socialistas, quando corruptos, roubam enfim a razão pela qual morreram todos os guerrilheiros. Traindo seus mortos, traindo os desaparecidos, o corrupto de esquerda se sente vitorioso. Acha que pode passear de conversível sem ser incomodado.

Comunismo de resultados

REVISTA ÉPOCA
Como o ex-nanico PCdoB instalou-se no centro do poder e tornou-se um foco de escândalos no governo Dilma

MARIANA SANCHES E RICARDO MENDONÇA

O Brasil sempre foi o país do futebol. Na última década, tornou-se também o país do petróleo e das Olimpíadas. Nas três categorias, reina um partido que saiu da clandestinidade nos anos 1980 para se acomodar no centro do projeto petista de poder. Após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais de 2002, o PCdoB foi recompensado por ter sido a única legenda, além do PT, a apoiá-lo em todas as suas tentativas de chegar ao Palácio do Planalto. Desde 2003, lideranças comunistas comandam o Ministério do Esporte e a Agência Nacional do Petróleo (ANP), instâncias fortalecidas após a escolha do Brasil para sediar a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos e com a descoberta dos campos da camada pré-sal. Com o poder, veio a responsabilidade, seguida de denúncias de cobrança de propinas e desvio de recursos. Diante das mais graves suspeitas de corrupção de sua história, o PCdoB se defende em bloco e tenta não ser reduzido a um pastiche dos ideais da esquerda que sempre disse defender.

No Partido Comunista do Brasil, a regra é um por todos e todos por um. “O princípio básico da organização do PCdoB é o centralismo democrático (...) para a construção das orientações partidárias sob um único centro dirigente e no qual as decisões tomadas são válidas para todos”, diz a legenda nos documentos em que se define. Na crise que levou Orlando Silva às manchetes dos jornais devido a denúncias de desvio de dinheiro no Ministério do Esporte, seus quadros demonstram seguir à risca essa orientação. Numa mostra notável de disciplina e fidelidade, muitos foram à mídia e aos palanques para fazer a defesa enfática do ministro.

“Acompanho sua trajetória desde os 16 anos de idade, desde quando liderava a nossa juventude. O senhor já abriu seus sigilos, fiscal e telefônico. Não tem mais que falar. Se o réu tem o que dizer, vá à PF, mostre as provas”, disse a deputada Manuela D’Ávila, pré-candidata à prefeitura de Porto Alegre. “O PCdoB está consciente de que é alvo de uma farsa de forças reacionárias e anticomunistas”, afirmou Nádea Campeão, presidente do diretório paulista. “O povo conhece o trabalho do ministro Orlando Silva e respeita as vitórias que ele vem ajudando o Brasil a alcançar”, disse o deputado federal Chico Lopes (CE).

A necessidade de defender um de seus principais quadros é uma realidade nova para um partido que esteve à margem do poder ao longo da maior parte de sua história. Criada em 1962 depois de um racha no antigo Partido Comunista Brasileiro, de 1922, a legenda passou décadas na clandestinidade. Nos anos 1970, patrocinou a Guerrilha do Araguaia, no sul do Pará, onde perdeu 60 militantes. Engrossou a campanha pelas eleições diretas para a Presidência, nos anos 1980, e até hoje ostenta a foice e o martelo. Ao mesmo tempo que faz alianças com ruralistas, kassabistas e sarneyzistas, continua reverenciando Marx e Lênin. Vive, segundo a descrição encontrada em seu site, “uma das fases mais ricas” de sua história.

A fidelidade ao projeto de levar Lula à Presidência garantiu espaço e influência do partido no governo federal. “É como se o irmão mais novo e mais forte, o PT, tivesse de dar espaço para a turma mais velha e mais fraca, o PCdoB”, diz o cientista político Rui Tavares Maluf. Hoje o PCdoB ocupa três cargos de destaque no governo Dilma Rousseff. Além do Ministério do Esporte, tem o ex-deputado federal Haroldo Lima na ANP, e o também ex-deputado Flávio Dino na Embratur, autarquia responsável pela política nacional de turismo.

No início do governo Lula, o poder era menor, embora os cargos ocupados fossem praticamente os mesmos (a Embratur só foi entregue ao PCdoB na gestão Dilma). Em 2003, o Ministério do Esporte era uma pasta recém-desmembrada do antigo Ministério do Esporte e Turismo, considerado um dos menos importantes da administração. Comandada inicialmente por Agnelo Queiroz – também suspeito de irregularidades, ele trocaria o PCdoB pelo PT e se tornaria governador do Distrito Federal (leia a reportagem) –, a pasta só conquistou relevância política na gestão Orlando Silva, com a escolha do Brasil como sede da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016.

A ANP também gozava de pouca visibilidade até a descoberta de petróleo na camada pré-sal. Foi de suas operações que surgiram as primeiras denúncias de corrupção envolvendo o PCdoB. Em julho, ÉPOCA divulgou um vídeo em que assessores da ANP negociavam com a advogada de empresários o pagamento de propina para destravar processos de empresas de combustíveis.

As denúncias que envolvem Orlando Silva chamam a atenção para o estranho estilo comunista de administração: a proximidade suspeita entre políticos empregados no governo federal e organizações não governamentais também ligadas ao PCdoB (leia a reportagem).

A mistura entre atividades de governo, partidárias e ações da sociedade civil salta aos olhos na principal base política do Partido Comunista do Brasil, a União Nacional dos Estudantes (UNE). A entidade é há décadas um braço do partido, que a controla por meio do grupo União da Juventude Socialista (UJS). Desde 1991, o grupo elege sucessivamente os presidentes e a maior parte das diretorias da UNE. Isso se mostrou um ótimo negócio para a legenda. O movimento estudantil é a mais fecunda fonte de quadros para o partido. O próprio Orlando Silva e três dos 15 atuais deputados comunistas foram da UNE: Aldo Rebelo (SP), Luciana Santos (PE) e Manuela D’Ávila (RS). Outros três da bancada também vieram de entidades estudantis.

A UNE também já foi alvo de denúncias, mas não consta que qualquer uma tenha resultado em condenação. A última dizia respeito à compra da sede nacional do PCdoB, um prédio de sete andares e 3.400 metros quadrados no centro de São Paulo, por R$ 3,3 milhões em 2008. Para pagá-lo, o partido usou R$ 603 mil doados por uma empresa de intercâmbio estudantil que mantinha convênio com a UNE para a emissão da carteira internacional de estudante.

Nas urnas, a estratégia do PCdoB sempre foi concentrar esforços nas eleições para o Legislativo. Conseguiu deixar de ser um partido nanico – estigma que o marcava até 2002 – e crescer, devagar e sempre. Hoje tem dois senadores e 15 deputados, a 11a bancada da Câmara, equivalente ao tamanho do PT em 1989, quando Lula disputou sua primeira eleição à Presidência.

O partido tem ainda atuação relevante no meio sindical. Seu braço no setor é a Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB), que reúne 533 sindicatos em todo o país. Trata-se da quarta maior central sindical do Brasil, atrás da Central Única dos Trabalhadores (CUT), da Força Sindical e da União Geral dos Trabalhadores (UGT). Os sindicatos na órbita do PCdoB representam cerca de 8% de todos os trabalhadores sindicalizados do Brasil, ou mais de meio milhão de pessoas. Contando as federações, associações e outros agrupamentos, a CTB reúne mais de 800 entidades.

Além da flexibilidade para alianças, dois movimentos marcaram a fase recente do PCdoB. O primeiro foi a tática de patrocinar candidaturas de figuras midiáticas. O exemplo mais vistoso disso é o cantor e apresentador de TV Netinho de Paula, atualmente vereador em São Paulo e pré-candidato à prefeitura. No ano passado, Netinho quase desbancou a petista Marta Suplicy na disputa por uma vaga no Senado. Há ainda o sambista Martinho da Vila, no Rio, a cantora Leci Brandão, eleita deputada estadual em São Paulo, e o ex-delegado Protógenes Queiroz, eleito deputado federal depois de ganhar notoriedade – e muitas críticas – ao liderar a investigação da Polícia Federal que chegou a prender duas vezes o banqueiro Daniel Dantas. “Não fica claro como se dá o processo de recrutamento dessas pessoas. Certamente não são as inspirações ideológicas”, diz o cientista político José Álvaro Moisés. “Isso dilui muito o perfil de um partido que se diz de esquerda.”

O segundo movimento recente que marca o PCdoB é a aliança liderada pelo deputado comunista Aldo Rebelo com a bancada ruralista no Congresso Nacional. Seu engajamento no tema foi tão forte que ele conseguiu destronar a senadora Kátia Abreu (PSD-TO) como principal defensora de abrandamentos na legislação ambiental. Do ponto de vista da história dos partidos que se dizem de esquerda, a aliança com o latifúndio foi mais uma inovação do PCdoB. Gosto pelo poder, denúncias de corrupção e ajustes ideológicos em favor do jogo político: nunca o PCdoB esteve tão longe da clandestinidade.

O perfeito imbecil politicamente incorreto

Cynara Menezes

No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião. Saiba como reconhecê-lo. Por Cynara Menezes. Foto: Reprodução
Em 1996, três jornalistas –entre eles o filho do Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa, Álvaro –lançaram com estardalhaço o “Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano”. Com suas críticas às idéias de esquerda, o livro se tornaria uma espécie de bíblia do pensamento conservador no continente. Vivia-se o auge do deus mercado e a obra tinha como alvo o pensamento de esquerda, o protecionismo econômico e a crença no Estado como agente da justiça social. Quinze anos e duas crises econômicas mundiais depois, vemos quem de fato era o perfeito idiota.



Mas, quem diria, apesar de derrotado pela história, o Manual continua sendo não só a única referência intelectual do conservadorismo latino-americano como gerou filhos. No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião que, no fundo, disfarça sua real ideologia e as lacunas em sua formação. Como de fato a obra de Álvaro e companhia marcou época, até como homenagem vamos chamá-los de “perfeitos imbecis politicamente incorretos”. Eles se dividem em três grupos:
1. o “pensador” imbecil politicamente incorreto: ataca líderes LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trânsgeneros) e defende homofóbicos sob o pretexto de salvaguardar a liberdade de expressão. Ataca a política de cotas baseado na idéia que propaga de que não existe racismo no Brasil. Além disso, ações afirmativas seriam “privilégios” que não condizem com uma sociedade em que há “oportunidades iguais para todos”. Defende as posições da Igreja Católica contra a legalização do aborto e ignora as denúncias de pedofilia entre o clero. Adora chamar socialistas de “anacrônicos” e os guerrilheiros que lutaram contra a ditadura de “terroristas”, mas apoia golpes de Estado “constitucionais”. Um torturado? “Apenas um idiota que se deixou apanhar.” Foge do debate de idéias como o diabo da cruz, optando por ridicularizar os adversários com apelidos tolos. Seu mote favorito é o combate à corrupção, mas os corruptos sempre estão do lado oposto ao seu. Prega o voto nulo para ocultar seu direitismo atávico. Em vez de se ocupar em escrever livros elogiando os próprios ídolos, prefere a fórmula dos guias que detonam os ídolos alheios –os de esquerda, claro. Sua principal característica é confundir inteligência com escrever e falar corretamente o português.
2. o comediante imbecil politicamente incorreto: sua visão de humor é a do bullying. Para ele não existe o humor físico de um Charles Chaplin ou Buster Keaton, ou o humor nonsense do Monty Python: o único humor possível é o que ri do próximo. Por “próximo”, leia-se pobres, negros, feios, gays, desdentados, gordos, deficientes mentais, tudo em nome da “liberdade de fazer rir.” Prega que não há limites para o humor, mas é uma falácia. O limite para este tipo de comediante é o bolso: só é admoestado pelos empregadores quando incomoda quem tem dinheiro e pode processá-los. Não é à toa que seus personagens sempre estão no ônibus ou no metrô, nunca num 4X4. Ri do office-boy e da doméstica, jamais do patrão. Iguala a classe política por baixo e não tem nenhum respeito pelas instituições: o Congresso? “Melhor seria atear fogo”. Diz-se defensor da democracia, mas adora repetir a “piada” de que sente saudades da ditadura. Sua principal característica é não ser engraçado.
3. o cidadão imbecil politicamente incorreto: não se sabe se é a causa ou o resultados dos dois anteriores, mas é, sem dúvida, o que dá mais tristeza entre os três. Sua visão de mundo pode ser resumida na frase “primeiro eu”. Não lhe importa a desigualdade social desde que ele esteja bem. O pobre para o cidadão imbecil é, antes de tudo, um incompetente. Portanto, que mal haveria em rir dele? Com a mulher e o negro é a mesma coisa: quem ganha menos é porque não fez por merecer. Gordos e feios, então, era melhor que nem existissem. Hahaha. Considera normal contar piadas racistas, principalmente diante de “amigos” negros, e fazer gozação com os subordinados, porque, afinal, é tudo brincadeira. É radicalmente contra o bolsa-família porque estimula uma “preguiça” que, segundo ele, todo pobre (sobretudo se for nordestino) possui correndo em seu sangue. Também é contrário a qualquer tipo de ação afirmativa: se a pessoa não conseguiu chegar lá, problema dela, não é ele que tem de “pagar o prejuízo”. Sua principal característica é não possuir ideias além das que propagam os “pensadores” e os comediantes imbecis politicamente incorretos.