Numa folha qualquer
Eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis retas
É fácil fazer um castelo...
Corro o lápis em torno
Da mão e me dou uma luva
E se faço chover
Com dois riscos
Tenho um guarda-chuva...
Se um pinguinho de tinta
Cai num pedacinho
Azul do papel
Num instante imagino
Uma linda gaivota
A voar no céu...
Vai voando
Contornando a imensa
Curva Norte e Sul
Vou com ela
Viajando Havaí
Pequim ou Istambul
Pinto um barco a vela
Brando navegando
É tanto céu e mar
Num beijo azul...
Entre as nuvens
Vem surgindo um lindo
Avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo
Com suas luzes a piscar...
Basta imaginar e ele está
Partindo, sereno e lindo
Se a gente quiser
Ele vai pousar...
Numa folha qualquer
Eu desenho um navio
De partida
Com alguns bons amigos
Bebendo de bem com a vida...
De uma América a outra
Eu consigo passar num segundo
Giro um simples compasso
E num círculo eu faço o mundo...
Um menino caminha
E caminhando chega no muro
E ali logo em frente
A esperar pela gente
O futuro está...
E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo, nem piedade
Nem tem hora de chegar
Sem pedir licença
Muda a nossa vida
E depois convida
A rir ou chorar...
Nessa estrada não nos cabe
Conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe
Bem ao certo onde vai dar
Vamos todos
Numa linda passarela
De uma aquarela
Que um dia enfim
Descolorirá...
Numa folha qualquer
Eu desenho um sol amarelo
(Que descolorirá!)
E com cinco ou seis retas
É fácil fazer um castelo
(Que descolorirá!)
Giro um simples compasso
Num círculo eu faço
O mundo
(Que descolorirá!)
Políticas públicas: Emenda ao projeto do Plano Nacional de Educação será discutida por comissão da Câmara
O lucro das estatais federais, como Petrobras, Banco do Brasil e Eletrobras, está na mira do ensino público brasileiro. Nos próximos dias, deputados da comissão especial responsável pela tramitação do Projeto de Lei 8.035, que trata da segunda edição do Plano Nacional de Educação (PNE), começam a debater uma emenda que prevê a destinação de 5% do lucro líquido das empresas vinculadas à União para investimentos em transporte e infraestrutura escolar, como, por exemplo, reformas, compra de materiais e construção de bibliotecas e laboratórios de informática e ciências.
De acordo com o Ministério do Planejamento, o levantamento mais atualizado (de 2009) sobre o desempenho das mais de cem estatais federais aponta lucro líquido consolidado de R$ 56,115 bilhões, valor que significaria quase R$ 3 bilhões em recursos novos para a educação básica. Para os próximos anos, o valor poderia chegar perto de R$ 5 bilhões, pois as companhias foram impactadas pela crise econômica em 2009. A proposta beneficiaria principalmente Estados e municípios com indicadores educacionais ruins e gasto anual por aluno baixo. O recurso seria repassado para um fundo a ser gerido pelo Ministério da Educação (MEC).
Formulada pelo especialista em financiamento educacional José Marcelino Rezende Pinto, professor da USP de Ribeirão Preto, e apresentada formalmente ontem pela entidade Campanha Nacional pelo Direito à Educação na Câmara dos Deputados, a emenda se encaixa como uma estratégia à meta 20 do PNE, que determina aumento gradual do investimento público em educação até 2020. O MEC, que não se pronunciou, sustenta que a evolução da arrecadação pública garantirá mais recursos para o setor, tese bastante contestada por movimentos do setor e pela maioria dos parlamentares da comissão especial do PNE.
Rezende Pinto lembra que, por orientação governamental, as empresas estatais, exceto Petrobras e Eletrobras, destinam parte de seu resultado para a composição do superávit primário. A emenda, diz, "coloca uma nova responsabilidade estratégica e emergencial" para as empresas controladas pelo governo. "As estatais podem dar uma contribuição importante em termos de equidade, com um recurso relativamente pequeno e precioso. A maioria das escolas públicas não tem bibliotecas decentes, não chega a 5% o percentual de escolas públicas com laboratório de ciências. Dotar as escolas com o mínimo de infraestrutura significa melhorar a qualidade", diz o acadêmico, que também preside a Associação Brasileira de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca).
Apuração do Valor revela que a ideia foi bem recebida por parlamentares de partidos da base do governo e da oposição. A reportagem ouviu dez dos 27 deputados da comissão especial do PNE. O deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE) foi o primeiro a acolher a proposta e garante que o assunto entrará na pauta da comissão especial do PNE. "O projeto do governo apresenta metas tímidas e controversas, não se sabe se os recursos serão suficientes para o cumprimento das 20 metas do plano. A Campanha congrega os melhores especialistas do setor para assuntos de financiamento da educação, por isso vamos assumir a emenda", afirma Santiago.
Para a deputada Professora Dorinha (DEM-TO), ex-secretária estadual de Educação de Tocantins, "a ideia é boa" porque apresenta novas fontes de recursos. "Hoje o maior gasto com educação está nas costas dos Estados e municípios, a União precisa se responsabilizar mais. Defendo a proposta, mas precisamos tomar cuidado para não tornar o PNE em uma bandeira única de financiamento. O plano tem uma série de metas qualitativas que precisam ser discutidas." A deputada Fátima Bezerra (PT-RN), principal parlamentar petista para assuntos educacionais, é mais reticente: "A ideia é válida porque vem na direção de ampliar recursos. Precisa ser melhor analisada, mas acho que o Congresso Nacional está mais sensível a propostas que demandam mais recursos para a educação."
Teresa Surita (PMDB-RR), vice-presidente da comissão especial do PNE, é favorável à transferência do lucro líquido das estatais federais para a educação desde que a medida não afete os negócios. "O direcionamento de parte dos lucros precisa ser feito na perspectiva da responsabilidade e da finalidade social das empresas sem, no entanto, prejudicar seus modelos de negócio", pondera. Seu colega na comissão Rogério Marinho (PSDB-RN) compartilha a opinião e emenda "É preciso analisá-la tecnicamente para saber se é viável."
Pensador elogia a democracia na América Latina, mas alerta contra o avanço do tráfico de drogas
O intelectual Francis Fukuyama já chegou a decretar o fim da história quando o capitalismo venceu o comunismo na Europa. Também acreditou na possibilidade de os Estados Unidos exportarem a democracia para partes do mundo sob ditaduras. Conhecido neoconservador até a guerra no Iraque, distanciou-se do grupo após a invasão de 2003 e passou a alertar para as dificuldades na tentativa de impor mudanças profundas em outras nações. Faz sentido que em seu novo livro, The origins of political order (As origens da ordem política), ele explore a história da construção de instituições sólidas, baseadas na lei. Ou seja, a história da luta pela democracia. Para ele, a América Latina segue no rumo certo, mas o resultado das revoluções árabes ainda é uma incógnita.
ENTREVISTA - FRANCIS FUKUYAMA
ÉPOCA – Como o senhor avalia a evolução das democracias na América Latina?
Francis Fukuyama – A situação das democracias na América Latina é ótima. Três presidentes deixaram o cargo com recorde de aprovação, (Álvaro) Uribe na Colômbia, (Michelle) Bachelet no Chile e Lula no Brasil. Não existe outro lugar no mundo em que você consegue governar por dois mandatos e se manter popular dessa maneira. Eu já fui inflexível com as democracias latino-americanas, mas hoje acredito que as instituições estejam mais fortes. Essa estabilidade é uma das razões do desempenho tão positivo da economia brasileira. Outro aspecto é a diminuição da desigualdade de maneira geral. E isso acontece devido à liberalização da economia e também a políticas sociais bem executadas.
ÉPOCA – O senhor vê a democracia também se consolidando na Venezuela?
Fukuyama – Chávez tem sido um desastre, mas acredito que ele seja mais um sintoma dos problemas da Venezuela. O país tem uma desigualdade profunda, se atrapalhou com o uso dos recursos vindos do petróleo e criou uma situação que deu origem à ascensão de Chávez.
ÉPOCA – Os presidentes da Bolívia, Evo Morales, e do Equador, Rafael Correa, são considerados os grandes aliados de Chávez na região. Como o senhor vê o futuro desses governos?
Fukuyama – Eles são bastante distintos. Correa é um político muito mais inteligente que Chávez. Ele não causou tantos danos ao país até agora como Chávez fez na Venezuela. Já Evo Morales faz algumas coisas que eu não gosto, como essa imposição da identidade indígena. O que vai ajudar a população indígena é a integração e inserção em um mercado de trabalho mais amplo, falando espanhol e se inserindo no mundo. Ficar preso aos idiomas indígenas não vai ajudar em nada. Mas se trata de uma mudança histórica que reflete a realidade. A população indígena que tomou o poder está agora se inserindo no sistema, e isso é positivo.
ÉPOCA – Qual é sua avaliação da situação da democracia na Argentina?
Fukuyama – Precisamos sempre medir o desempenho de um país em relação a seu potencial. E a Argentina tem sido um dos maiores desastres da América Latina. Em termos de recursos naturais, clima e população, a Argentina deveria ser um país como o Canadá, próspero, rico, bem governado e democrático. Mas é uma bagunça.
ÉPOCA – A que o senhor atribui essa bagunça?
Fukuyama – Os Kirchners são apenas os últimos de uma lista de políticos muito ruins, que não administraram a economia da maneira correta e não aprenderam com os erros que cometeram. Eles sempre voltam para as mesmas políticas populistas, desde o governo de (Juan Domingos) Perón. Esse tipo de populismo que eles praticam não ajuda em nada. Por um período, pareceu que eles estavam se tornando um país moderno, mas isso nunca aconteceu de fato.
ÉPOCA – O senhor é um conhecido crítico do clientelismo. O que os países podem fazer para combater essa prática?
Fukuyama – Acredito que o clientelismo seja uma consequência da pobreza e da falta de investimentos em educação. Esse problema também existiu na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, no século XIX. Depois tivemos grupos que limparam o cenário político. Eu vejo que a mesma coisa está acontecendo no Brasil. Estou ciente dos esforços para a criação de leis que condenam políticos e já ouvi falar de políticos que foram condenados no Brasil. Se você é um brasileiro bem instruído ou um empresário com conexões internacionais, não vai querer lidar com esse tipo de político. Então, a melhora de qualidade dos políticos depende do eleitorado brasileiro. Mas é um processo lento.
ÉPOCA – Mas o senhor enxerga uma solução para o problema?
Fukuyama – Sim, e a solução não está apenas ligada à prosperidade econômica do país. Está ligada à modernização, ao investimento em educação e ao desenvolvimento de uma classe média forte.
ÉPOCA – Qual é o maior desafio para as democracias na América Latina hoje?
Fukuyama – Eu acredito que seja a segurança dos cidadãos. Hoje nós temos o tráfico de drogas, que está se espalhando cada vez mais. Se não resolvermos esse problema, não teremos democracias bem-sucedidas na região.
ÉPOCA – No mundo árabe, qual deverá ser o resultado a longo prazo das revoluções em países como Tunísia e Egito?
Fukuyama – Acredito que as pessoas vão se decepcionar. Existe um grande fervor das pessoas, mas não há organização. Aqueles que realmente querem democracia na Tunísia e no Egito não estão bem organizados, e os organizados não necessariamente querem democracia. Então vai levar um tempo para que as coisas se resolvam. Acredito que a Tunísia esteja melhor que o Egito, porque lá o Exército e o islã estão mais fracos. Mas pelo menos esses dois países não têm os mesmos problemas tribais e étnicos que outros têm na região.
ÉPOCA – Qual deverá ser o papel dos grupos islâmicos, em especial a Irmandade Muçulmana, nesse processo de reconstrução dos dois países?
Fukuyama – Até agora eles estão fazendo um papel democrático, mas isso foi o que (o aiatolá) Khomeini dizia na Revolução Iraniana. Tenho certeza de que parte da Irmandade Muçulmana gostaria de sequestrar essa revolução e criar um Estado islâmico, assim como outros talvez estejam realmente interessados em democracia. Eu consigo imaginar um final muito bom e um final muito ruim para essa história.
ÉPOCA – Podemos ver alguma revolução na China?
Fukuyama – A China tem um modelo muito poderoso, de muito sucesso, autoritário, que está passando por um processo de modernização. Acredito que eles possam vir a enfrentar resistências por parte da população, mas não acredito que isso vá acontecer em breve. Eles estão crescendo muito rápido, há muitas oportunidades para todo mundo, e a população percebe isso.
ÉPOCA – A Europa passa por uma crise econômica e política. Quais são os maiores desafios para as democracias europeias?
Fukuyama – As reações aos imigrantes ilegais é um grande desafio, pois podem levar a políticas populistas. Mas eles também têm pela frente a renegociação dos contratos sociais, porque o estado de bem-estar social da maioria dos países europeus não é sustentável.
QUEM É
Americano de 58 anos, casado e com três filhos, Fukuyama é Ph.D. em ciências políticas pela Universidade Harvard e professor da Universidade Stanford (EUA)
O QUE FEZ
Criou a tese do “fim da história”, baseada na vitória do liberalismo, após o fim do comunismo na Europa
O QUE PUBLICOU
O fim da história e o último homem (1992), Construção de Estados (2004) e Depois dos neoconservadores (2006), entre outros
Professora do Rio Grande do Norte ganha fama ao enfrentar deputados e expor a situação precária da educação no País
Oito minutos. Foi o tempo necessário para a professora potiguar Amanda Gurgel roubar a cena, dias atrás, numa audiência pública na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. Com apenas 1,57 m de altura, mas postura de gigante, ela proferiu um discurso no qual dizia, com ideias bem amarradas e rara transparência, receber salário de R$ 930 por mês (“menos do que os deputados gastam em suas indumentárias”), que os professores vivem uma crise de identidade e estão doentes. A condição indigna dos docentes não é novidade, mas o vídeo com a sincera fala de Amanda correu o País com intensidade impressionante e colocou em foco esse profissional, sobre quem está depositado o futuro do Brasil. Duas semanas depois de o vídeo do discurso ser postado na rede, havia sido visto quase 1,6 milhão de vezes.
Amanda, 28 anos, começou a dar aula aos 21. Há três, foi diagnosticada com depressão, afastou-se da escola e retornou em funções fora da sala de aula. Hoje, dá expediente na biblioteca de um colégio estadual e no laboratório de informática de um municipal. Além dos R$ 930, seu salário do município, recebe R$ 1.217 pelo Estado. Amanda decidiu lecionar ainda adolescente, mesmo sabendo que a remuneração era baixa. “Só entendi de fato o que isso significava quando tive de me sustentar e comprar meu primeiro quilo de feijão”, conta. Órfã de pais desde menina, ela nasceu em Natal e foi criada pelos tios. Estudou em escolas públicas e privadas, no interior do Estado. Solteira, sem filhos, tem uma rotina puxada. Mora sozinha numa quitinete, acorda às 5 horas, pega três ônibus para ir trabalhar e volta para casa somente às 22 horas.
ISTOÉ – O que mudou na sua vida desde a divulgação do vídeo?
Amanda Gurgel – Minha rotina está temporariamente alterada. A repercussão do vídeo gerou um assédio nacional e esse é um momento que eu quero divulgar os problemas da educação no País e ser uma porta-voz de meus colegas. Então, estou me doando.
ISTOÉ – Pensa em se candidatar a algum cargo público?
Amanda – Olha, não me vejo agora fazendo outra coisa. Sei que o meu lugar é na classe trabalhadora, no chão, na escola, junto com os meus colegas. Sou filiada ao PSTU desde o ano passado, mas sempre fui militante, primeiro no movimento estudantil, depois pela causa da educação. Mas, nunca pensei em me candidatar a nada. É uma discussão futura.
ISTOÉ – Como gasta seu salário?
Amanda – Não tenho luxo, só gasto com o essencial, como alimentação, moradia, vestimentas e plano de saúde. Quase não tenho acesso a lazer. A última vez que fui ao cinema foi em 2010.
ISTOÉ – Por que se afastou da sala de aula?
Amanda – Houve um tempo em que eu trabalhava em três horários, estava na rede privada, acabei assumindo o município e tinha uma média de 600/700 alunos. Comecei a dar aula em 2002, tinha 21 anos, estava eufórica, topando tudo. O ápice do problema de saúde foi de 2007 para 2008, quando percebi que estava estafada. Estava em sala de aula com alunos pouquíssimos proficientes. Alunos de sexto ano que não sabiam ler palavras básicas como bola, pato, entendeu? Comecei a me desesperar diante da realidade, não sou alfabetizadora. O que vou fazer se nada do que estou preparada para oferecer eles estão preparados para receber? Sou professora de língua portuguesa e literatura portuguesa e brasileira de alunos dos ensinos fundamental II e médio.
ISTOÉ – Por que as crianças não aprendem?
Amanda – O aluno de 6 anos está em uma sala de aula superlotada e não há condição de alfabetizar ninguém dessa forma. Fala-se muito em democratização do ensino básico, mas se cada etapa do processo de aprendizado não é trabalhada de forma adequada, não há democracia. A escola virou um depósito de crianças, que é o que os políticos querem. Eles querem ter um lugar para deixar a criança enquanto os pais vão trabalhar e nada mais.
ISTOÉ – Foi o início da sua crise?
Amanda – Foi. Fiquei um tempo de licença e voltei em adaptação de função. Minha última aula como professora de português foi em 2008.
ISTOÉ – Quais funções você desempenha em cada escola?
Amanda – A resposta revela um sério problema de infraestrutura. Na escola do Estado, onde trabalho de manhã, estou na biblioteca. Na escola do município, passei por diversas funções. Passei pela coordenação e pela biblioteca e agora estou no laboratório de informática. Apesar de os computadores terem chegado há cinco anos na escola, só agora eles começaram a funcionar.
ISTOÉ – Por quê?
Amanda – Por várias questões. Primeiro, a instalação das máquinas foi muito demorada. Para isso, é necessário um técnico da secretaria porque a escola perde completamente a garantia daquelas máquinas se acontecer qualquer coisa errada. Depois de instaladas, foi um longo processo para a chegada de um técnico para fazer funcionar a internet e outro extenso período para a instalação do ar-condicionado na sala. Foram cinco anos que nós passamos com os computadores na caixa e com aquela sala fechada, apesar de toda a carência que se tem de espaço.
ISTOÉ – Qual o principal problema da educação no País?
Amanda – Se for para eleger um apenas, eu diria a falta de investimento. Como pode um País que deveria investir 5% do seu PIB em educação e investe 3%, paga esse salário irrisório aos professores e deixa a estrutura da escola chegar a um estágio de precarização que precisa ser interditada, como aconteceu numa escola no interior do Rio Grande do Norte, na cidade de Ceará Mirim?
ISTOÉ – Por que foi interditada?
Amanda – O corpo de bombeiros interditou a escola porque nada mais funcionava lá. O teto estava para desabar, a instalação elétrica estava precária, oferecendo risco à integridade física dos alunos e dos professores. Todos esses problemas estão relacionados à falta de investimento. Com um salário digno, o professor poderia ficar na escola, preparando as aulas, conhecendo os alunos, poderia evitar casos como o do atirador Wellington de Menezes. Como um professor vai ser capaz de observar algo se ele tem 600 alunos e não é capaz de, quando chega em casa, visualizar quem são todos? Não temos como mudar essa realidade se não tivermos um investimento imediato. Não estou falando de daqui a dez anos. Há a necessidade de se investir 10% do PIB do País em educação.
ISTOÉ – A que você credita a sua educação?
Amanda – É uma junção de coisas. Desde muito novinha, sempre fui metida. Comecei a ser alfabetizada e já corrigia as pessoas. Também acho que o funcionamento das escolas no interior é bem diferente do da capital. Nas cidades pequenas, onde estudei, funciona melhor. O fato de o professor ter acesso direto aos pais dos alunos coloca a criança e o adolescente na situação de “eu não posso sair da linha, senão o professor vai falar para a minha mãe”. Então, há mais disciplina. Minha educação de base foi de fato muito boa.
ISTOÉ – Se algum aluno disser a você que quer ser professor o que diria?
Amanda – Depende do dia. Acho que fiz certo, mas tenho meus momentos. Já cheguei a dizer ‘não quero mais’, mas em outros momentos, como hoje, estou me sentindo cheia de energia para estar na sala de aula e trabalhar com o aluno. Quando a gente é adolescente, tem uma estrutura familiar por trás. Sempre soube que professor ganhava mal, mas só entendi de fato o que isso significava quando tive de me sustentar e comprar meu primeiro quilo de feijão.