terça-feira, 23 de novembro de 2010

Uma escola diferente para o neto de Dilma

Autor(es): Cláudio Gradilone

Isto é Dinheiro - 22/11/2010







Uma das campanhas presidenciais mais tensas e agressivas da história recente teve uma breve trégua no dia 9 de setembro passado. Nesse dia, a então candidata Dilma Rousseff interrompeu o bate-boca com José Serra para assumir, com gosto, o papel de avó coruja do primeiro neto, o recém-nascido Gabriel.



Filho do administrador de empresas Rafael Covolo e da procuradora do trabalho Paula Rousseff Araújo, única filha de Dilma, ele nasceu no hospital Moinhos de Vento, um dos melhores de Porto Alegre. Seu futuro está bem mais garantido que o da maioria dos seus 2,7 milhões de compatriotas que deverão nascer em 2010.





Seus pais vão deixar sua saúde aos cuidados de bons médicos da iniciativa privada. Deverão educá-lo em bons colégios, para os quais ele irá, com todas as precauções, de carona no automóvel familiar.



O cotidiano de Gabriel não é nada excepcional para uma criança nascida em uma casa brasileira de classe média. No entanto, no que depender do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), do mesmo partido que a presidente eleita se originou, esse dia a dia pode ser diferente.



Se fosse considerado dependente de Dilma, Gabriel teria de fazer como os cidadãos que não nascem em casas de classe média e enfrentar a realidade das escolas públicas.



Desde outubro de 2007 dorme nas gavetas da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) o Projeto de Lei do Senado 480, que obriga todos os agentes públicos eleitos, para o Executivo ou para o Legislativo, a matricular seus filhos na escola pública. “Não há maior prova do desapreço para com a educação do que ter os filhos dos dirigentes brasileiros estudando em escolas privadas”, diz Buarque.



Na proposta, enviada à CCJ, Buarque estimou que os quase 65 mil eleitos – dos vereadores a Presidente da República – tenham deduzido mais de R$ 150 milhões em 2007 para financiar a educação dos filhos.



O raciocínio do senador, conhecido por sua defesa extremada da educação, é simples: se sentissem na pele os problemas da escola pública, os governantes ficariam muito mais atentos à sua qualidade.



Vale a pena avançar nessa ideia. Se os filhos dos eleitos tivessem forçosamente de conviver com os filhos de seus eleitores, a discussão sobre a qualidade da escola pública sairia do plenário do Congresso e desembarcaria nas mesas do jantar em Brasília.



A proposta poderia avançar: os eleitos teriam de disputar leitos hospitalares na rede pública e também seriam obrigados a usar apenas o transporte público. Não, é melhor parar por aqui. A ideia de um senador subindo em um ônibus em horário de aperto é bizarra demais para ser considerada.



Nada impede que a aplicação dessa regra provoque mais uma das muitas distorções da vida brasileira, que é a criação de escolas públicas diferenciadas, cujas vagas estariam reservadas para os filhos dos mandatários eleitos. No entanto, a polêmica proposta de Buarque não deve ser relegada ao mofo das gavetas.



Não há dúvida de que os pais de Gabriel vão se desdobrar para proporcionar ao filho a melhor saúde e a melhor educação que o dinheiro pode comprar. A proposta de Buarque tornaria mais garantido que sua avó fizesse o mesmo com os mais de 11 milhões de conterrâneos de seu neto que deverão nascer entre 2011 e 2014, durante sua gestão na Presidência.

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