Gazeta do Povo 18/11/2010
Jacir J. Venturi
O respeito à hierarquia e às normas da escola carece da efetiva participação dos pais para que a boa rotina escolar não seja comprometida
Resgatar o respeito, o prestígio e até o glamour da carreira do magistério é o primeiro passo para uma significativa melhoria em nosso debilitado sistema educacional. A desvalorização do professor é o principal limitador para que os nossos mais talentosos alunos abracem a sublime missão de legar uma geração melhor que a nossa.
Em subsequentes anos e salas distintas do ensino médio, refaço a mesma pergunta: quem de vocês quer ser professor?
A resposta é previsível: nenhum ou no máximo dois alunos por sala erguem corajosamente a mão. Tal resultado coaduna-se com a pesquisa da Fundação Victor Civita: apenas 2% dos 1.500 jovens entrevistados gostariam de ser professor.
Colocando o dedo na ferida – e isso dói – há razões para esse despautério que deve ser compartilhado pelos governos, famílias e docentes. A principal joia da coroa de uma estrutura educacional deve ser a sala de aula. Esses são os metros quadrados mais nobres, e quando o seu entorno não é bom a sala também é maculada.
Aos governantes compete instituir planos de carreira estimuladores, nos quais se estabeleçam critérios de meritocracia. “A universalização do Ensino Fundamental no Brasil foi feita à custa dos baixos salários dos professores” – opina enfaticamente Célio Cunha, da Unesco.
O respeito à hierarquia e às normas da escola carece da efetiva participação dos pais para que a boa rotina escolar não seja comprometida. Quando famílias e alunos de bem se omitem, a alegoria é de duas trincheiras opostas: em uma, professores e gestores e, na outra, alunos indisciplinados, perniciosos e pais ou permissivos ou agressivos.
No resgate do prestígio da carreira do magistério, o mais relevante é a postura e o profissionalismo do docente: manter-se atualizado nos avanços da sua matéria e das novas práticas e tecnologias educacionais, aula bem preparada para o enlevo da motivação e disciplina, além de um bom nível de exigência no conteúdo, a fim de promover nos educandos bons valores, autonomia e autodidatismo.
Nenhum país nutre tão profunda reverência aos mestres quanto o Japão. Tive o privilégio de passar um fim de semana com 40 docentes nipônicos para uma troca de experiência. Eles dedicam dois turnos a uma única escola, onde lecionam, atendem os alunos, corrigem tarefas e preparam aulas. Professores e alunos têm em conjunto um almoço frugal na escola, feito por uma cozinheira e, pedagogicamente louvável: não há a figura da zeladora. A limpeza dos pratos, talheres, pátios, salas, corredores, é tarefa dos alunos e professores. Com autoestima elevada, dizem os mestres nipônicos que gozam da deferência da comunidade e recebem incentivos para viagens e atividades culturais. São considerados “bons partidos” pelas moças e moços casadouros pelos 45 dias de férias, emprego estável e por gostarem de crianças. E deixaram escapar uma lamúria: o salário é aquém dos engenheiros, médicos, executivos e quase metade é comprometido com o aluguel nos subúrbios de Tóquio.
No Brasil, quando se fala de status, remete-se ao professor de cursos pré-vestibulares. São bons didatas, têm alunos motivados, estrutura física e tecnologia excelentes, salários elevados, 60 dias de férias e ambiente de glamour. Um colega meu, professor de Matemática, fazia galhofa: “É tão bom dar aulas em cursinho e ainda somos pagos”.
Para finalizar, reitero a conhecida frase de dom Pedro II, que bem demonstra o enlevo da profissão: “Se não fosse imperador, desejaria ser professor. Não conheço missão maior e mais nobre que a de dirigir as inteligências jovens e preparar os homens do futuro”.
Jacir J. Venturi é diretor de escola, autor de livros e foi professor da educação básica e ensino superior.
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