quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Lei da Informação é vitória do cidadão contra o Estado, avalia historiador

Autor(es): Daniel Bramatti
O Estado de S. Paulo - 27/10/2011

*Entrevista: Marco Antonio Villa, historiador 

Para o historiador Marco Antonio Villa, a aprovação da Lei de Acesso às Informações Públicas é uma "vitória do cidadão contra o Estado". 

Como o senhor avalia a nova legislação? Temos uma tradição no Brasil de Estado forte e sociedade civil frágil. Houve uma inversão nessa aprovação. A lei dá ao cidadão um poder de fiscalização sobre o Estado que nós não tínhamos. Isso é muito importante e deve ser saudado. Foi uma vitória do cidadão contra o Estado. Como historiador, sua expectativa é de que se abra logo o acesso a documentos antigos? Uma questão chave é ver como será implementada a lei. Não pode ser uma lei só para inglês ver. O governo pode transformar tudo em ultrassecreto, e aí abrir só daqui a 50 anos. Isso seria um golpe. O acompanhamento da implementação da lei é tão importante quanto sua aprovação. Houve reações ao projeto no Senado... O ex-presidente Fernando Collor (de Mello) teme que se faça revelações ainda mais amplas sobre seu período na Presidência da República. O atual presidente do Senado, José Sarney, também colocou inúmeros obstáculos para a aprovação do projeto, porque quer evitar revelações sobre seu quinquênio no governo, que todos sabemos que foi desastroso. A lei é uma das mais avançadas que devem existir nas democracias ocidentais, mas o receio é a implementação. É preciso acompanhar de perto esse processo. Teremos de mudar hábitos péssimos da elite política brasileira, que não gosta de prestar contas aos cidadãos.

ESCOLA 'ANTECIPA' ENEM E 639 PROVAS SÃO ANULADAS; PF INVESTIGA SUBORNO

Escola 'antecipa' Enem e 639 provas são anuladas; PF investiga suborno
O Estado de S. Paulo - 27/10/2011

Educação. Suspeita é de que Colégio Christus, de Fortaleza, teve acesso há um ano a conteúdo de pré-teste, realizado pelo MEC para avaliar grau de dificuldade das questões que caem na prova; para ministro Fernando Haddad, "situação está administrável"


Um simulado realizado no Colégio Christus, de Fortaleza, dez dias antes da aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), apresentou nove questões idênticas à prova aplicada no fim de semana passado em todo o País. A informação foi antecipada pelo portal estadão.com.br. O Ministério da Educação (MEC) não crê em vazamento da prova após a impressão e suspeita que a escola tenha tido acesso a questões do pré-teste realizado em 2010. Os 639 alunos do colégio terão de refazer o exame.

O MEC acionou a Polícia Federal para investigar o caso. As nove questões estavam em pré-teste realizado em outubro do ano passado em cinco Estados, entre eles o Ceará. Uma das linhas de investigação da PF é de que um funcionário do Colégio Christus tenha subornado um fiscal que aplicou questões do pré-teste na escola e copiado o caderno.

A aplicação das questões ficou sob responsabilidade do consórcio formado pela Fundação Cesgranrio e FUB/Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe). No pré-teste foram distribuídos 16 cadernos de questões contendo 24 itens cada. Após a aplicação, os cadernos foram recolhidos, levados para Brasília, tabulados e incinerados.

O simulado realizado dez dias antes do Enem no colégio com as questões idênticas ao Enem é exatamente igual à prova de pré-testes - por isso, sequer tem logotipo do Christus. O MEC afirma não ter registrado sumiço do caderno. Em pré-testes realizados em anos anteriores, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) já chegou a cancelar questões do pré-teste por sumiço do caderno.

Todas as questões do Enem são testadas previamente em um grupo reduzido de estudantes, para determinar o grau de dificuldade. O exame é corrigido pela Teoria de Resposta ao Item (TRI), conjunto de modelos matemáticos que permite que estudantes com o mesmo número absoluto de acertos possam ter notas finais diferentes - a dificuldade desses itens são decisivas para a nota. Além disso, as questões pré-testes possibilitam que o exame possa ter uma comparação entre um ano e outro.

Facebook. O caso veio à tona depois que fotos do caderno de questões do simulado foram publicadas em um perfil no Facebook, na noite de terça-feira. Uma estudante de Fortaleza, que tem uma prima que estuda no Christus, já havia comentado nas redes sociais sobre a coincidência de questões na noite de sábado, primeiro dia de exame.

De acordo com o colégio, o simulado ocorreu dez dias antes do Enem. A escola publicou uma nota de esclarecimentos em seu sit. O texto afirma que, "como há o pré-teste de questões utilizadas no Enem, existe a possibilidade de que essas questões caiam no domínio público antes da realização oficial do exame, as quais eventualmente podem compor o banco de dados de professores e de outros profissionais da área de educação".

O Ministério Público Federal no Ceará vai recomendar que o Enem 2011 seja anulado em todo o País. O procurador da República Oscar Costa Filho soube do episódio por alunos que o procuraram. "É necessário que se imponha, de uma vez, a constitucionalidade no Enem, o que significa o direito de candidatos que se sentirem prejudicados recorrer", disse. Ele acha injusto que só os estudantes do Christus tenham de refazer a prova, porque eles podem ter passado as questões para outras escolas.

Os 639 alunos do Christus farão o novo exame nos dias 28 e 29 de novembro, quando a prova também será aplicada a presidiários de todo o País. "A situação está administrável", disse o ministro Fernando Haddad à noite, ao sair do MEC. Ele entrou no carro e foi embora sem responder se considerava o exame deste ano um sucesso, apesar do episódio de Fortaleza. / CEDÊ SILVA, CARLOS LORDELO, PAULO SALDAÑA, CARMEN POMPEU, MARIANA MANDELLI, RAFAEL MORAES MOURA

Educação no Brasil evoluiu, diz Prêmio Nobel

Autor(es): Por Diogo Peixoto | Do Rio
Valor Econômico - 27/10/2011


A educação brasileira evoluiu e está mais voltada para a infância, avalia James Heckman, vencedor do Prêmio Nobel de Economia no ano 2000. Ele não vinha ao Brasil havia dois anos, e ontem participou do seminário "Educação das crianças na primeira infância: a experiência brasileira e internacional", ^que foi organizado pela Escola de Pós-gradução em Economia da Fundação Getulio Vargas (EPGE/FGV), no Rio de Janeiro.

Na avaliação do economista, especializado em educação, o fato de o Brasil preocupar-se agora mais com a educação infantil - que engloba as crianças de até cinco anos de idade - é fruto de um progresso natural, no qual as escolas passam a ser o foco de ação governamental na área educacional, ao contrário do que ocorria antes, quando o ensino superior era o alvo prioritário do governo.

"No passado, os esforços brasileiros eram concentrados no ensino superior, nas universidades públicas", afirmou Heckman, que leciona na Universidade de Stanford, na Califórnia, Estados Unidos.

Para ele, o governo brasileiro precisa pensar e elaborar a educação infantil de forma integrada com outras áreas, incluindo na formulação das políticas públicas educacionais a saúde e a segurança pública.

Heckman também defende a ideia de que o governo brasileiro precisa tomar medidas para alterar as regulações de pesquisa, de maneira a incentivar parcerias entre instituições de ensino ou pesquisa públicas e empresas privadas.

"Nos Estados Unidos, você vê farmacêuticas trabalhando junto com empresas de informática e universidades. Há várias parcerias entre as companhias instaladas no Vale do Silício e a Universidade de Stanford", afirmou.

Na visão de Heckman, o Brasil possui boas universidades, que poderiam alavancar as pesquisas, colocando o país no mapa mundial da ciência. "O Brasil poderia ter um forte impacto na indústria de pesquisa, porque há ótimas universidades e centros de pesquisa aqui", disse.

Senado aprova criação da Comissão da Verdade

Autor(es): agência o globo:Evandro Éboli
O Globo - 27/10/2011
 BRASÍLIA


Projeto que permite investigar crimes da ditadura vai à sanção da presidente; colegiado não terá poder de punição. O Senado aprovou ontem, por unanimidade e em votação simbólica, o projeto que cria a Comissão da Verdade, que deverá ser instalada ainda este ano. Agora, o projeto vai à sanção da presidente Dilma Rousseff. A sessão que aprovou a comissão durou cerca de quatro horas, e vinte senadores, da oposição e do governo, discursaram a favor do relatório do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), um ex-militante de esquerda e que durante a ditadura atuou na luta armada. Após a aprovação, os senadores comemoravam o resultado com ex-perseguidos e familiares de desaparecidos que acompanharam a sessão. A Comissão da Verdade será composta por sete integrantes, escolhidos pela presidente da República, e terá um prazo de dois anos para funcionar. A missão da comissão é levantar informações sobre mortes, torturas, desaparecimentos, apontar locais onde ocorreram essas violações contra os direitos humanos e identificar responsáveis. O colegiado terá poderes até mesmo de convocar os depoentes, mas não poderá punir. No seu relatório, Aloysio Nunes, por três vezes, afirmou que os agentes do regime criaram uma "máquina de matar" e um dos objetivos da comissão é detalhar como funcionava e onde. O senador reafirmou que o grupo não terá poderes juriscidionais, ou seja, não poderá punir responsáveis identificados por esses atos. - Não se admite na democracia um tribunal de exceção. Essa função é do Poder Judiciário. As informações ali levantadas podem até ser enviadas para a Justiça para os que sentirem atingidos - disse Aloysio Nunes. O relator disse também que o golpe militar teve a colaboração de civis: - Civis participaram. Médicos-legistas que serviram ao regime atestavam que pessoas que morreram em sessões de torturas e assassinados friamente morreram em combate. O que era uma mentira - disse. Apesar de o texto aprovado prever a apuração de violações cometidas desde a ditadura de Getúlio Vargas, na década de 40, Aloysio defendeu que as investigações se concentrem no regime instaurado a partir de 1964, em especial após a edição do AI-5, que cassou mandatos, fechou o Congresso, perseguiu opositores, torturou e desapareceu com militantes de esquerda. Foi o endurecimento do regime, conhecido como golpe dentro do golpe. A sessão foi presidida pela senadora Marta Suplicy (PT-SP), que, ao proclamar a aprovação, comentou. - A presidente terá uma noite bastante feliz. Presente à sessão, a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, comentou o resultado: - A criação da Comissão da Verdade é um tributo aos que lutaram e, generosamente, ofereceram suas vidas por essa causa - disse a ministra.

Escravidão sem fim

Autor(es): agência o globo:Geralda Doca

O Globo - 26/10/2011

OIT diz que Bolsa Família e fiscalização não conseguiram vencer o trabalho degradante





Oprincipal programa de transferência de renda do governo, o Bolsa Família, e a fiscalização não têm sido suficientes para extirpar o trabalho escravo no Brasil. Estudo divulgado ontem pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) traçou, pela primeira vez, o perfil das vítimas do trabalho escravo no país. Elaborado a partir do depoimento de 121 trabalhadores resgatados entre 2006 e 2007, o estudo mostrou a baixa escolaridade dos resgatados e a falta de ações para criar oportunidades nas regiões que mais fornecem este tipo de mão de obra.

Em 67% das famílias de trabalhadores libertados, existiam crianças e adolescentes, sendo que 28% (quase um terço) delas eram beneficiárias do Bolsa Família. O levantamento revelou também que quase 60% dos trabalhadores resgatados no país já foram escravizados antes e que a fiscalização do governo conseguiu libertar apenas 12,6% do universo de trabalhadores nestas condições, de acordo os dados do Ministério do Trabalho.

A pesquisa apontou forte relação entre trabalho escravo e infantil no país: 92,6% do total de entrevistados começaram a trabalhar antes dos 16 anos. Na média, aos 11,4 anos, mas cerca de 40% já trabalhavam antes.

Segundo Luiz Antonio Machado, coordenador do projeto da OIT de combate ao trabalho escravo no Brasil, o Bolsa Família ajuda a reduzir a vulnerabilidade dos trabalhadores porque melhora a alimentação das famílias. Mas, por si só, não evita que os chefes dessas famílias se submetam a condições degradantes de trabalho, com cerceamento de liberdade - o que caracteriza o trabalho escravo.

- O Bolsa Família é insuficiente e a fiscalização não consegue cobrir todo o país ou mesmo os estados com maior concentração (da irregularidade) - afirmou Machado.

Agropecuária concentra trabalho escravo

Machado destacou que o alto índice de recorrência - 59,7% dos resgatados já haviam estado na situação de escravidão anteriormente - deve-se à falta de alternativas, restando aos trabalhadores sem qualificação nas áreas rurais apenas a "empreitada", que exige só força física. Segundo ele, também é preciso investir em campanhas de conscientização frequentes para estimular os próprios trabalhadores a fazerem a denúncia. Na maioria das vezes, eles são liberados no fim da empreitada sem receber pelo serviço.

A renda média declarada desses trabalhadores foi de 1,3 salário mínimo, sendo que 40% informaram ser o único responsável pela renda das famílias que têm, em média, 2,4 filhos.

Ele defende a necessidade de ações complementares para tornar as politicas mais efetivas. Entre elas, estimular a criação de empregos nos locais de residência dos trabalhadores e oferecer cursos de capacitação profissional.

De acordo com a pesquisa, 85% dos trabalhadores entrevistados, além de terem baixíssima escolaridade (analfabetos e com menos de quatro anos de estudo), nunca fizeram curso de qualificação. No entanto, 81,2% declararam que gostariam de fazer algum curso, principalmente os mais jovens (95,2% dos que têm menos de 30 anos). A preferência recai nas áreas de mecânica de automóveis, operação de máquinas, construção civil (pedreiro, encanador, pintor) e computação.

Maranhão, Paraíba e Piauí são os exportadores de mão de obra escrava para outros estados. Eles estão entre as principais origens dos trabalhadores resgatados em Goiás (88%) e no Pará (47%). No Mato Grosso e na Bahia, 95% deles eram da própria região.

Segundo a OIT, a agropecuária continua sendo o setor de maior concentração de trabalho escravo, sobretudo nas fazendas de cana-de-açúcar e produção de álcool, como é o caso do Pará; plantações de arroz (Mato Grosso); culturas de café, algodão e soja (Bahia); e lavoura de tomate e cana (Tocantins e Maranhão).

Segundo a pesquisa, o aliciamento se dá, na maioria dos casos, pela rede de relações pessoais; os "gatos" (aliciadores) e escritórios que funcionam como agências de emprego aparecem em segundo lugar. Em terceiro estão hotéis, pensões e locais públicos, como rodoviárias, estações de trem e ruas das cidades.

O conceito de trabalho escravo apontado pela OIT considera, além das condições precárias (falta de alojamento, água potável e sanitários, por exemplo), cerceamento à liberdade pela presença de homens armados, dificuldades de acesso às fazendas e dívidas contraídas de forma forçada pelos trabalhadores para pagar alimentação e despesas com ferramentas usadas no serviço.

O Ministério do Trabalho informou que a pasta não comentaria a pesquisa porque o responsável pela área de fiscalização estava incomunicável ontem.