Brasil S.A - Antônio Machado |
Correio Braziliense - 18/07/2012 |
Não há dúvida de que a educação no Brasil espelha o fracasso dos governantes. Essa é a avaliação praticamente consensual. Mas pode ser que alguma coisa mudou para melhor e não nos demos conta — nem o governo Dilma Rousseff, atrapalhado com greves nas universidades federais e com o projeto aprovado na Câmara, que dobra para 10% do PIB em dez anos a aplicação de recursos públicos em educação.
Há controvérsia sobre se a qualidade do ensino seja baixa devido à falta de dinheiro. Essa é uma discussão universal. E mesmo aqui não há elementos conclusivos. Um estudo divulgado esta semana nos Estados Unidos, dissecando o último relatório do National Assessment of Educational Progress (Naep) — ou Avaliação Nacional do Progresso em Educação, que serviu de modelo para o nosso Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) —, confunde um pouco mais o que se sabe da questão. Com base em tal estudo, patrocinado pelo Programa de Política de Educação e Governança da Universidade de Harvard, o Brasil ocupa a terceira posição num ranking que lista os países em que a qualidade do ensino mais avançou entre 1995 e 2009 (de 2000 a 2009, no caso brasileiro). Letônia, Chile e Brasil lideram a lista, seguidos de Portugal, Hong Kong, Alemanha, Polônia, Liechtenstein, Eslovênia, Colômbia, Lituânia, Inglaterra, Singapura, Suíça e Grécia.
A pesquisa engloba 49 países. Nos últimos lugares, de baixo para cima, houve retração da qualidade do ensino, no período, na Suécia, Bulgária, Eslováquia, República Tcheca, Romênia, Noruega, Irlanda e França. Anote-se: o desempenho dos alunos brasileiros nas matérias consideradas — matemática, ciência e leitura — continua abaixo dos resultados nesses países. Mas, enquanto houve queda absoluta do grau de acerto em todos eles, o desempenho da educação no Brasil avançou mais rápido que em todos os outros, juntamente com Letônia e Chile.
Intitulado Achievement Growth: International and U.S. State Trends in Student Performance, e assinado pelos professores Eric Hanushek, Paul Peterson e Ludger Woessmann, das Universidades de Stanford, de Harvard e de Munique, da Alemanha, respectivamente, o estudo busca avaliar qual a situação da educação nos EUA. A situação do Brasil, assim como de outros países, é apresentada marginalmente, só como medida de onde está a educação nos EUA. Fato é que não saímos mal.
Do Naesp ao Pisa e IEA
A abrangência da metodologia usada pelos autores reforça e amplia as conclusões, já que o ranking é o resultado da consolidação de três outros sistemas internacionais de avaliação do ensino, além do Naep, administrado pelo Departamento de Educação dos EUA. Por um sistema de conciliação estatística das diferentes bases de avaliação, eles incluíram também o Pisa, da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), e duas outras medidas de desempenho do ensino, ambas da IEA (International Association for the Evaluation of Educational Achievement).
O ranking em que Brasil desponta, assim, é o resultado de quatro métricas conceituadas sobre a capacidade de leitura e conhecimento de matemática de alunos das 4ª e 8ª séries em nível internacional. Ao todo, o estudo considerou 28 testes, aplicados a cada três ou quatro anos conforme a entidade. Foram incluídos países que tenham participado, ao menos, de dois ciclos de testes e excluídos os que não têm resultados para um mínimo de nove baterias de avaliação.
Ao ritmo de 4% ao ano
É assim que os autores chegaram a apenas 49 países, demonstrando o rigor do trabalho, disponível no endereço www.hks.harvard.edu. Para o período analisado, o desempenho dos alunos brasileiros nos testes de proficiência em matemática e leitura cresceu a um ritmo anual de 4,05%, só superado pelas taxas de Chile (4,37%) e Letônia (4,70%).
Nos EUA, o crescimento foi de apenas 1,57% ao ano, um progresso em relação aos anos anteriores a 1995, mas insuficiente, segundo os autores, para atender a necessidade da formação nos tempos atuais. A questão é se tal resultado conversa com a pesquisa conjunta do Instituto Paulo Montenegro e da Ação Educativa, também divulgada estes dias, segundo a qual 38% dos estudantes brasileiros do ensino superior não dominam habilidades básicas de leitura e escrita.
Dinheiro não garante 10
E educação de qualidade depende de dinheiro? O resultado não tem "significância estatística ou substantiva", diz o estudo. Em média, nos EUA, o gasto adicional de US$ 1 mil por aluno é associado a um ganho anual de um décimo de 1% nos exames. Houve aumentos de gasto em educação, diz o estudo, nos estados de Maryland e Massachusetts, e os resultados foram expressivos, mas em Nova York e Wyoming, que também aumentaram a despesa, foram desprezíveis. Mas notável é que houve melhora da avaliação do ensino em estados com o orçamento da educação constante. A polêmica continua.
Quem avalia o professor
A questão da educação de qualidade tem múltiplas facetas, algumas não diferentes do problema vivido pelos EUA, onde a demanda é até maior, sendo uma economia dependente de inovações tecnológicas. Lá e cá as políticas são federais e estaduais, com zonas cinzentas sobre responsabilidades. Uma maneira de clareá-las seria criar um ranking entre os estados, implicando uma sanção moral ao governante relapso. O estudo de Harvard indica quem não faz a lição de casa.
Também cabe legislar sobre a progressão continuada, a causa, para muitos, da formação de analfabetos funcionais. E talvez também do resultado pavoroso da pesquisa sobre a formação dos universitários. Na educação, nada é simples, como a avaliação do professorado, com ou sem prêmio de mérito — fórmula aplicada em Nova York e adaptada em São Paulo e Minas. A questão salarial se insere neste contexto, mas com algo que comprometa o sistema nos resultados dos alunos.
|
segunda-feira, 23 de julho de 2012
Educação premiada
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário