quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Educação não é carente apenas de verbas

Autor(es): Agência O Globo
O Globo - 02/09/2010


Construído o consenso na sociedade em torno do objetivo estratégico de se melhorar o ensino público básico, tem havido saudável mobilização de grupos, dentro e fora do Estado, numa empreitada cujos horizontes de tempo são medidos em décadas. No aspecto político da missão, é imperioso obter a adesão de governos, em todos os níveis, na busca de metas. A mais geral é o país atingir em 2020 o nível de proficiência verificado no Primeiro Mundo em 2003. Em números: os estudantes do ciclo básico precisarão atingir nota média 6, daqui a dez anos, dois pontos acima da nota do última exame nacional, em 2009.

Nesse sentido, merece destaque a iniciativa de quase três dezenas de entidades de formular uma carta-compromisso, sob a inspiração do Movimento Todos pela Educação, a ser subscrita pelos principais candidatos a presidente da República. Deverão fazê-lo. A questão será cumprir as promessas, e isso dependerá de constante cobrança da sociedade. Afinal, uma das metas incluídas na carta é elevar o gasto público na educação a 10% do PIB, dos quais 8% com o nível básico, e 2% com o superior. Na prática, significa inverter de vez as prioridades na política de gastos com educação e dobrar o atual dispêndio. Para isso, sem considerar a hipótese reprovável do aumento de impostos - até porque a carga tributária se acha no limite -, será necessário remanejar verbas e enfrentar previsíveis resistências políticas.

Se a mobilização de recursos públicos é chave, também é imperioso que no "chão de fábrica" sejam aplicados bons programas. Por óbvio, a mobilização e a qualificação do professorado são imprescindíveis. Nesse aspecto, aconselha-se acompanhar a política educacional do governo de Barack Obama, para combater o mesmo mal: baixa qualidade do ensino básico. Também nos EUA, depois de gerações de êxito, as escolas públicas naufragaram e, já há algum tempo, são alvo de políticas específicas, federais, estaduais e municipais, para voltar a formar estudantes com a mesma qualificação fornecida já há algum tempo em salas de aula sul-coreanas, chinesas, escandinavas etc. Situações econômicas e sociais podem ser diversas, mas em todo o mundo o professor é o centro dos cuidados. Tem havido nos Estados Unidos, como aqui, choques constantes entre governos e sindicatos de professores, tão corporativistas quanto os nossos. Mas os governantes americanos não recuam e aplicam métodos de qualificação, avaliação do professorado, para efeito de premiação, como passou a ser feito em São Paulo e no município do Rio, por exemplo. Nossa herança cultural embebida de visão cartorial e de estamentos, vinda com as caravelas de Portugal, nos impede de ir tão fundo quanto os americanos: escolas improdutivas têm sido fechadas, e os alunos, remanejados; professores são demitidos, e assim por diante. Lá, é verdade, não existe estabilidade do funcionalismo como no Brasil.

Ilusão pensar que acordaremos um dia calvinistas e anglo-saxões. Mas reformas aplicadas em prefeituras como a de Nova York - onde há casos de sucesso de escolas administradas por terceiros - e na criação de programas de distribuição de bilhões de dólares federais em prêmios a estados que alcançam metas de rendimento escolar precisam ser acompanhadas com atenção.

Será catastrófico se a meta dos 10% do PIB for alcançada e não existirem programas eficazes para serem executados.

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